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'Não faz sentido testar todo mundo para coronavírus', diz David Uip

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O infectologista David Uip, que está coordenando um comitê de contingenciamento para enfrentar a chegada do coronavírus em São Paulo, diz que não vê sentido na realização de testes diagnósticos em todas pessoas com sintomas da doença.
Segundo ele, os testes são importantes apenas em dois momentos: para confirmar a chegada do vírus ao Brasil e para checar se está havendo contaminação entre pessoas que não viajaram para o exterior.
 “A testagem é importante em termos epidemiológicos, mas individual não. Não muda nada a assistência a esse paciente.”
Para Uip, a rede paulista de leitos hospitalares é suficiente para atender a um eventual aumento de demanda causada pelo coronavírus, uma vez que eles serão destinados apenas aos casos graves.
“Se todo mundo que tossir e tiver febre procurar a rede pública, não tem sistema que aguenta. Nem no Brasil e nem no mundo.”
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PERGUNTA – Quantos leitos de isolamento o estado de São Paulo terá para os casos de coronavírus?
DAVID UIP – O número de leitos no Estado passa de 10 mil, sendo 7.000 de UTI. Estão sendo elencados alguns hospitais estaduais que vão fazer ao atendimento terciário. Entre eles, os hospitais Emílio Ribas de São Paulo e da Baixada Santista, Hospital das Clínicas de São Paulo e da Unicamp e Hospital Estadual de Bauru. São hospitais que já estão prontos para receber os doentes graves, que têm leitos de isolamento, por exemplo.

P – Mas a rede está sobrecarregada, faltam leitos. Ou não?
DU – A rede de leitos é suficiente, o que precisa é dar velocidade para essa rede. Doentes de UTI ficam internados mais tempo do que normalmente deveriam ficar. Também é preciso entender que a maioria dos casos de coronavírus vai ser resolvida na atenção primária. O que está se vendo com o aprendizado da China que é um percentual menos de doentes graves do que se imaginava, em torno de 10%.
No final o que vai valer para rede hospitalar é doente grave. Se todo mundo que tossir e tiver febre procurar a rede pública não tem sistema que aguente. Nem no Brasil e nem no mundo. O que temos que está prontos é para a demanda da alta complexidade.

P – E a atenção primária está treinada e capacitada para reconhecer e encaminhar esses casos mais graves?Mais de mil funcionários da Secretaria Municipal da DU – Saúde de São Paulo foram treinados, pelo menos um representando cada unidade de saúde.  

P – O fato de o estado de São Paulo estar registrando muitos casos de dengue não piora a situação, especialmente em relação aos diagnósticos?
DU – Dengue é uma preocupação eterna. As doenças virais, e a dengue está incluída, tem manifestações clínicas iniciais muito parecidas, como dor no corpo, mal-estar geral e febre. Com a evolução da doença, se define uma e outra. E vamos ter outra situação daqui a pouco, os vírus sazonais, como o Influeuza, o rinovírus. E aí tem uma boa medida será antecipar a campanha da vacinação da gripe. Com isso, você diminui a prevalência de pelo menos três vírus, dois Influenza A e um B.

P – Todo mundo que chegar numa unidade de saúde com sintomas será testado para o coronavírus?
DU – Num primeiro momento é importante testar para afirmar que o vírus chegou ao Brasil. Num segundo momento, é importante testar para checar se as  pessoas se contaminaram sem ter viajado. Na minha opinião, para por aí. O custo do painel viral é de R$ 1.600. O custo do PCR para coronavírus é de R$ 250. Então, depois de um número, não tem o menor sentido confirmar o diagnóstico etiológico mesmo porque não tem resposta terapêutica específica. Você não acrescenta nada. Gestor público tem que ter a sabedoria de saber o que precisa investir e o que não precisa. Se você confirma que tem o vírus no Brasil e que há contaminação entre indivíduos que não viajaram, está bom, não precisa ficar testando. Aí você deixa o exame para casos mais graves. Como rotina, não tem o menor nexo.

P – Mesmo se tratando de paciente privado não tem sentido fazer a testagem?
DU – Aí são escolhas. A testagem é importante em termos epidemiológicos, mas individual não. Não muda nada em termos de assistência a esse paciente.

P – Há muitos oportunistas de plantão, inclusive médicos, oferecendo supostas terapias preventivas, como vitaminas? O que sr. pensa sobre isso?
DU – Isso é inadmissível. Merece processo ético nos conselhos regional e federal de medicina. Eu mesmo vi propaganda de médico receitando vitamina D contra o coronavírus. As pessoas têm que ter seriedade. As medidas protetivas a gente já conhece, como lavar as mãos, proteger nariz e boca quando espirra, se tiver sintomas, ficar em casa e repouso, boa nutrição e boa hidratação. O resto não tem nexo nenhum. 

P – A taxa de transmissibilidade do vírus no Brasil tende a ser menor levando em conta que estamos no verão?
DU – A taxa que estamos vendo no mundo é de um para dois, um para três. Mas isso serve de referência para clima frio. Se você olhar o mapa, são os países que vivem o inverno agora. Na Itália, é a região mais fria. Como ele vai se portar num clima quente como o nosso, ainda não sabemos, não temos essa definição.  

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