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Uso de equipamentos protetores leva ao desabastecimento e falsa sensação de proteção

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Nos últimos dias, com o aumento diário do número de casos de Covid-19 no país, muitos se perguntam: vou sair de casa, devo ou não me proteger com máscara? E luvas?
A indicação oficial da OMS (Organização Mundial da Saúde) é de que EPIs (equipamentos de proteção individual), como máscaras e luvas, devem ser usados apenas por profissionais de saúde tratando de pacientes, por pessoas contaminadas, ou ainda por pessoas que cuidam de pessoas infectadas.
Pessoas saudáveis não devem usar máscaras, uma vez que não há evidências de que seu uso impede a transmissão do Sars-CoV-2.
Por outro lado, países como Singapura, Japão e Hong Kong tiveram sucesso no controle do novo coronavírus ao aliar o uso de máscaras ao isolamento social.
A dúvida quanto à utilização das máscaras e o crescente medo da população fizeram com que o equipamento sumisse das farmácias na cidade de São Paulo já em janeiro. Os profissionais de saúde pediram às pessoas que não utilizem as máscaras como medida de prevenção pois EPIs já estão em falta nos hospitais públicos.
Quando se fala em máscara, há que se levar em conta que elas existem em diferentes modelos. Elas são confeccionadas em materiais diversos, com maior ou menor eficácia para o controle viral, de acordo com o uso a que se destinam.
Existem dois tipos de máscaras: as cirúrgicas, descartáveis e confeccionadas de tecido não-tecido (TNT), comumente encontradas nas farmácias, e os respiradores -também chamados “bico-de-pato”, N95 ou PFF2, dependendo da fabricação-, que são capazes de filtrar até 95% das partículas aerossóis (espessura menor que 5µm) presentes no ar.
As máscaras cirúrgicas retêm gotículas de saliva ou muco que podem ser expelidas quando uma pessoa doente tosse ou espirra, mas não tem propriedade filtradora de aerossóis. A Anvisa recomenda seu descarte logo após o uso. Elas não podem ser reutilizadas ou desinfetadas.
Já as máscaras N95 possuem uma longevidade maior, podendo ser usadas por até sete dias. São máscaras recomendadas para o contato direto com pacientes em quadro grave, como no tratamento da tuberculose. Elas também não podem ser desinfetadas, uma vez que molhar a máscara danifica sua filtração.
Para retirar, é importante não tocar na parte interna da máscara nem na parte externa frontal, puxando as duas alças de trás da orelha e guardando imediatamente as máscaras em saco de papel, que evita umidade, por até 24 horas.
Segundo o infectologista do Hospital das Clínicas de Botucatu e integrante do Centro de Contingência do Coronavírus do Estado de São Paulo Carlos Magno Fortaleza, as máscaras de tecido não têm eficácia comprovada e os estudos que mostram relação de causalidade entre uso de máscaras e contenção de doenças são falhos.
“O profissional de saúde que utiliza máscara tem eficácia [na prevenção] de um para um -no caso de quem trata um paciente infectado, ele está se protegendo. Agora, quantas pessoas precisam usar a máscara na rua para evitar a disseminação da doença? Não temos esse número, por isso falamos que é estatisticamente insignificante o uso de máscaras pela população”, diz.
De acordo com nota técnica publicada pela Anvisa, o correto é o profissional de saúde que tem contato com pessoas contaminadas usar a N95, mas o uso da máscara cirúrgica pode ser efetivo em locais onde circulam muitas pessoas, como em ambulatórios e centros de triagem.
É importante ter em mente que a proteção exigida varia também de acordo com as propriedades de cada vírus e suas diferentes formas de contágio e propagação, como explica a infectologista Thais Guimarães, do Hospital das Clínicas de SP e do Hospital do Servidor Público.
Sarampo, rubéola e tuberculose, por exemplo, são doenças virais que podem ser transmitidas apenas pela sua presença no ar (“airborne”).
Já a gripe comum é “passada” por aspiração direta de gotículas de uma pessoa infectada que espirra e tosse ou então pelo contato em superfícies -ao passar a mão no nariz ou na boca e depois tocar em locais de uso comum, como maçanetas, botões de elevadores ou barras de apoio de metrôs e ônibus.
As máscaras cirúrgicas, afirma a infectologista, são utilizadas contra doenças transmissíveis através de gotículas, caso da catapora, da caxumba e da gripe comum. Por isso, seu uso é recomendado para profissionais de saúde. Estas doenças, no entanto, só conseguem chegar até um segundo hospedeiro -pessoa saudável ou profissional de saúde- se ele estiver num raio de 1 m de distância de outro doente.
Dessa forma, o distanciamento social por si só já seria suficiente para impedir o contato de pessoas saudáveis com pacientes contaminados.
No entanto, a falta de evidências científicas sobre o novo coronavírus e sua forma de transmissão tem levado a uma disputa entre especialistas e líderes políticos sobre como se proteger.
Não há consenso sobre o tempo que o Sars-CoV-2 permanece no ar antes da sua total evaporação, mas estudos preliminares indicam que o vírus possa permanecer por até três dias em plástico e aço inoxidável.
Nesse caso, Guimarães conclui que o procedimento correto para evitar o contágio é sempre lavar as mãos antes de tocar o rosto e que o uso de máscaras não vai ser uma proteção efetiva se esses hábitos não forem adotados.
Outros especialistas defendem o uso de máscaras. André Nathan Costa, pneumologista do Hospital Sírio-Libanês e membro da Sociedade Brasileira de Pneumologia, relata que o uso de máscaras por qualquer pessoa que possa vir a apresentar sintomas de Covid-19, mesmo antes de ter um diagnóstico, é recomendado como forma de prevenção.
“Alguns países divergem na orientação, mas o uso das máscaras por pessoas que não foram diagnosticadas pode ser eficaz onde há aglomeração de pessoas, para evitar que as gotículas de espirro ou tosse se espalhem naquele local”, diz.
Por isso, embora não seja a orientação defendida pelos órgãos de saúde, o uso de máscaras descartáveis em ambientes fechados e densamente populados, como trens e metrôs, pode, na opinião de Costa, ajudar na prevenção.
O pneumologista ressalta, porém, que o seu uso não deve exceder três horas -e que deve-se levar em conta que, se a pessoa tirar a máscara por qualquer razão, precisa jogá-la fora e colocar uma nova.
Médicos e enfermeiros protestaram nas capitais, no sábado retrasado (21), contra o uso inadequado de EPIs e a falta de recurso. O Ministério da Saúde comunicou à reportagem que divulgaria uma portaria -a ser lançada ainda nesta semana- visando à criação de parcerias público-privadas para a produção de máscaras.
A pasta reforça, no entanto, que não é recomendado o uso de máscaras por pessoas saudáveis, uma vez que traz a sensação de falsa proteção. As medidas a seguir, segundo o ministério, são a higienização das mãos com água e sabão ou álcool em gel 70% e a etiqueta respiratória (cobrir a boca e nariz com os braços ao tossir ou espirrar).
A higiene constante também prevalece sobre o uso de luvas. Thais Guimarães reforça que a prática dá a sensação falsa de não contaminação, o que faz com que a lavagem das mãos seja desprezada.
No caso do setor de alimentação, deve haver uma pessoa que manipula a comida e outra que recebe o pagamento. “Os profissionais de saúde e alimentação devem ter unhas curtas e limpas, e a higienização das mãos, como indicado pela OMS, é a medida mais importante para evitar transmissão de infecções”, completa a infectologista.
“Higienizem as mãos, higienizem as mãos, higienizem as mãos! Com a luva você vai pegar tudo e contaminar tudo, e depois tocar no rosto [sem lavar as mãos]. Não faz sentido usar” é também o recado de Carlos Magno Fortaleza.

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