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Cessar-fogo reduziu hostilidades na Síria, diz ONU

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O cessar-fogo na guerra civil da Síria, pactuado entre Rússia e Turquia em março, surtiu efeito e reduziu a intensidade das hostilidades e dos ataques, mas crimes de guerra seguem sendo cometidos por todos os lados do conflito, segundo um relatório da Comissão Independente de Inquérito para a Síria, do Conselho de Direitos Humanos da ONU, desta terça (15).

Segundo o documento, a pandemia também contribuiu para reduzir as hostilidades, com restrições de circulação e fechamento de fronteiras. Apesar disso, surtos de violência e constantes violações de direitos humanos continuam.

A Síria vive uma guerra civil desde 2011, na qual grupos rebeldes e o grupo terrorista Estado Islâmico (EI) combatem o governo do ditador Bashar al-Assad e lutam entre si.

Potências estrangeiras se envolveram. A ditadura quase caiu, mas em 2015 Moscou interveio e instalou um destacamento aéreo no país, revertendo a sorte do aliado com o apoio terrestre de forças iranianas e do Hizbullah.

Os EUA ajudavam os curdos, um grupo rebelde, mas, abruptamente, os abandonou em outubro de 2019 e abriu caminho para uma operação turca contra a população da maior nação apátrida do mundo.

Já a Turquia apoia os rebeldes do Exército Nacional Sírio, o antigo Exército Livre da Síria, contrários a Assad e que se concentram hoje na província de Idlib, onde o cessar-fogo com a Rússia tem validade. Relatórios mostram que o número de mortos despencou.

O Observatório Sírio de Direitos Humanos, ONG britânica que monitora o conflito com base em fontes locais, estima que, em nove anos, cerca de 586 mil pessoas morreram –mais de 200 mil civis.

Após fevereiro registrar recorde de mortos em 23 meses (1.771), o número cai seguidamente. Em março foram 508 mortes, e nos meses subsequentes o total ficou sempre próximo de 300, até os 238 em agosto, o menor já registrado.

Há também o Estado Islâmico, que, apesar de ter perdido a maior parte do território sob seu controle, segue ativo.

Segundo investigadores, o grupo segue atacando as Forças Democráticas Sírias, no nordeste, e o Exército Árabe Sírio, do governo de Assad, no centro. Mas violações de direitos humanos e crimes de guerra não são cometidos apenas pelo EI. “Todos os atores controlando territórios continuam sujeitando civis a abusos.”

Em áreas controladas pelo governo, a comissão registrou “52 ataques emblemáticos marcados por crimes de guerra” realizados “por todas as partes”, com mortes de civis. A comissão diz que, como resultado das ações, quase 1 milhão de pessoas fugiram, e a maioria vive em precários campos de refugiados.

O documento também relata desaparecimentos. Em alguns casos, já dura oito anos.

Além disso, o aparato de segurança estatal segue reprimindo a população civil e detendo pessoas sem o devido processo legal, mantendo-as sem comunicação, em condições sub-humanas e com inúmeros relatos de torturas.

“A comissão documentou 13 relatos de torturas de pessoas mantidas em detenção por autoridades sírias, com algumas sendo torturadas por longos períodos, até mais de sete anos”, diz. “Os presos eram agredidos com cabos e bastões, amarrados em torno de pneus, pendurados em tetos e paredes e chicoteados.”

Um entrevistado detalha como dividia cela de 2 metros quadrados com 11 presos. Outro diz ter ficado em uma solitária menor sem colchão ou cobertor por três meses.

Um terceiro detalha um corte de água de 23 dias em sua cela. O espaço, que incluía o banheiro, ficou repleto de urina, fezes e vômito. Outro entrevistado afirma que geralmente recebia um pedaço de pão e quatro azeitonas por dia. Os presos chegavam a comer os caroços.

O documento afirma que prisioneiras e prisioneiros foram abusados sexualmente.

Entre o Exército Nacional Sírio, violações também foram recorrentes, em muitos casos “com tons sectários”. Civis (especialmente os de origem curda) eram torturados, tinham acesso a água e comida negados e eram interrogados sobre sua fé e etnia. Mulheres e meninas seguem sujeitas a estupros e violência sexual.

Há indicações de transferência de presos sírios para a Turquia. São indiciados por crimes que teriam sido cometidos na Síria, mas julgados sob a legislação turca. “Transferências de presos sírios para território turco podem ser considerados crimes de guerra por deportação ilegal de pessoas protegidas.”

Há evidências de saques e confiscos de propriedades de civis pelo Exército Nacional Sírio. Quem tentava reclamar era ameaçado e extorquido e detido. Alguns desapareciam.

O relatório aponta a ocorrência de prisões arbitrárias, tortura e maus-tratos de curdos, além de detenções sem comunicação por até um ano.

O documento é referente a 11 de janeiro a 1º de julho deste ano. A comissão recomenda ampliação do cessar-fogo, a libertação em larga escala de prisioneiros, a interrupção de torturas e a interrupção de saques e confisco de propriedades de civis e de locais arqueológicos e religiosos.

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