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Vivemos uma situação de guerra no Pantanal, diz senador de comissão de queimadas

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Senador em primeiro mandato após 24 anos como deputado federal, Wellington Fagundes (PL-MT) tem visto a cidade em que nasceu, Rondonópolis (MT), arder em chamas.

À frente da comissão do Senado que acompanha os incêndios no Pantanal, o senador, médico veterinário de formação, trabalha para que o Estatuto do Pantanal seja concluído nos próximos meses. A legislação criará uma certificação para atividades sustentáveis na bacia do rio Paraguai, a fim de mitigar os danos ambientais na produção.

Sem culpar fazendeiros, Fagundes, 63, aponta a inércia do Estado e a falta de políticas públicas como razões da tragédia que atinge a região. Mais de 1/4 do bioma foi consumido pelo fogo neste ano, a maior parte em decorrência de ações humanas como a queima para manejo de pastagem e ampliação a área de plantio, amplificadas por um período de secas especialmente intenso.

PERGUNTA – Como os senhores pretendem trabalhar a questão da pecuária em uma área tão delicada e necessária quanto o Pantanal?

WELLINGTON FAGUNDES – Mais de 90% da área do Pantanal é da iniciativa privada. Portanto, a responsabilidade da conservação do bioma é privada, na experiência centenária do pantaneiro. Não é o boi que precisa do Pantanal, é o Pantanal que precisa do boi. Temos visto uma diminuição do gado no Pantanal.

Mato Grosso do Sul fez uma modificação da lei, e Mato Grosso não. Com isso, temos uma restrição muito grande no Pantanal mato-grossense para fazer limpeza de área, a queima controlada, a formação de novas pastagem para o alimento do gado.

Como essa queima é cíclica, assim como as enchentes, tem de haver muitas chuvas nas cabeceiras para que o Pantanal realmente encha, o que não aconteceu no ano passado. Não tem reserva de água em local nenhum.

P. – Qual sua sensação ao ver tanta destruição?

WF – A gente fica estarrecido. A gente vê a destruição com a tristeza e a revolta. Temos tecnologia suficiente no mundo, temos o Inpe, satélite da Nasa, que já tinham previsão de seca de mais quatro ou cinco anos. E mesmo assim tudo chegou como uma surpresa.

O Estado como um todo não se preparou para isso. Tivemos um depoimento do próprio general [Augusto] Heleno [ministro do Gabinete de Segurança Institucional], que disse que o governo não teve tempo de se preparar e cuidar da Amazônia e do Pantanal.

Para nós aqui causa uma grande impotência. Por isso criamos nossa comissão externa, para chamar a atenção do governo e mostrar quanto tempo isso vai demorar, e ao mesmo tempo propor uma ação legislativa. Tudo com a democracia brasileira é demorado. Para chegar qualquer recurso na ponta é demorado.

E vivemos duas situações aqui, que é a pandemia, porque a Covid está no Pantanal também, e a questão dos incêndios. Vivemos uma situação de guerra no Pantanal. A Defesa Civil já veio, liberou parte dos recursos. Pelo menos temos agora a presença efetiva de Corpo de Bombeiros, de brigadistas e da Marinha.

P. – Se o governo fosse menos negacionista [em relação aos problemas ambientais] teríamos menos problemas no Pantanal?

WF – O Brasil não tem cultura de planejamento. Não temos política de Estado, nossas políticas são de governo, e aí aquilo que está estabelecido às vezes não é tocado para a frente. Cada ministério quer fazer um programa novo, e isso leva a muito desperdício, de esforço físico e econômico.

No nosso caso, não temos uma segurança jurídica que permita o desenvolvimento sócioambiental do sistema, por isso [criar] o Estatuto do Pantanal. Para trazer a segurança jurídica, colocando essa sustentabilidade econômica com a conservação do Pantanal.

P. – O problema do Pantanal são as ocupações?

WF – No Pantanal, só 15% da área está com a presença da ocupação. O problema do Pantanal é o abandono. Falta política pública definida do que fazer e a forma como fazer.

P. – O governo tem citado o clima como responsável pelas queimadas. Como o sr., presidente da comissão, fará para que o governo não se exima da responsabilidade?

WF – Já estamos cobrando participação mais efetiva do governo. E felizmente o governo veio. Tenho de elogiar os trabalhos dos brigadistas, bombeiros, Forças Armadas, especialmente a Marinha.

A característica do Pantanal é a criação de bezerro, não tem subsídio. E o clima mudou drasticamente, a temperatura, está constatado, aumentou. O governo já admitiu isso.

P. – É aceitável que se negue tanto os problemas ambientais do país?

WF – O presidente Bolsonaro faz uma política [ambiental] para fora, especialmente para as nações que querem puxar a orelha do Brasil. A gente já ouviu muito sobre a internacionalização da Amazônia, talvez por ele ser militar. Quando vêm aqui os ministros, essa dúvida não existe. É um caso do presidente.

Nós precisamos de uma política perene, de investimentos. Por isso estamos pedindo uma audiência com o presidente da República, na qual queremos levar um diagnóstico para ele, mas a reivindicação para que o governo possa fazer de imediato um programa emergencial da recuperação do que é hoje.

P. – Qual valor vocês estimam para esse programa?

WF – Vai ter de ser criada uma linha de crédito especifica para reconstrução de cercas, de casas, pois muitos perderam tudo. Não temos ainda o valor levantado. Precisamos limpar o que foi destruído. Assim como foi criado o Pronampe, talvez [precisemos de] um Pronampe do Pantanal.

P. – O Brasil tem passado por uma série de tragédias ambientais nos últimos anos. O Pantanal não corre o risco de ser esquecido?

WF – O Brasil tem memória curta, e o governo tem memória mais curta ainda. Não tem um governo que faça política de Estado. Tanto é que o Brasil é campeão de obras inacabadas.

Esse discurso que estamos fazendo há 20, 40 anos foi repetido quase sempre da mesma forma. Por falta de política definida, o Pantanal foi ficando abandonado. As tragédias no Pantanal são resultado do abandono de políticas de governo.

P. – O sr., como aliado do governo, defende a criação do Renda Cidadã?

WF – Esses programas sociais foram fundamentais para garantir a vida dos desempregados e das micro e pequenas empresas, para garantir o dinheiro circulando na base.

Se não fosse a pressão do Congresso, essas políticas não existiriam. A política econômica deste governo não tinha esse viés, ele terá de refazer a política econômica, porque o presidente gostou muito dessa linha social. O governo não vai concluir [o mandato] com a mesma linha que entrou.

P. – É impossível a reforma tributária sair neste ano?

WF – Reformas administrativa e tributária, ao mesmo tempo, não se consegue.

P. – O sr. defende a PEC da reeleição no Senado?

WF – Assinei a PEC, no Brasil tem muito de a gente assinar para promover uma discussão. Preferia discutir do que votar no afogadilho. Muitos pedem que não se tenha reeleição, e a Constituição é clara. Discutido em cima da hora, o processo de reeleição parece mais interesse pessoal. Mas, no Executivo, a reeleição tem sido um bom negócio.

Wellington Antônio Fagundes, 63

De Rondonópolis (MT), é senador pelo PL. Médico veterinário formado pela UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), presidiu a Associação Comercial e Industrial de Rondonópolis por dois mandatos, de 1983 a 1986. Em 1990, foi eleito deputado federal, cargo para o qual seria reeleito em 1994, 1998, 2002, 2006 e 2010. Desde 2015, está no Senado.

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