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Governo Bolsonaro vai apostar em game finlandês de alfabetização

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O governo Jair Bolsonaro (sem partido) vai apostar na adoção de um jogo de alfabetização a ser disponibilizado gratuitamente para todo o país. Um dos objetivos é tentar mitigar o impacto do fechamento das escolas durante a pandemia, período em que o MEC (Ministério da Educação) tem sido cobrado por ações de apoio às redes de ensino.

O Graphogame foi desenvolvido por pesquisadores finlandeses e seu uso acumula evidências de sucesso, inclusive em países pobres, como a Zâmbia. O desafio no Brasil será alcançar as famílias de renda mais baixa, que sofrem mais com exclusão digital e também amargam os piores resultados educacionais.

A iniciativa deve ser apresentada nos próximos dias pelo MEC (Ministério da Educação) em evento com a presença do presidente, e contará com forte campanha publicitária. A alfabetização foi alçada como prioridade do governo na área.

O governo gastou R$ 105 mil com a licença do jogo, em contrato com o Instituto do Cérebro ligado à PUC-RS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul). O instituto é parceiro exclusivo da instituição finlandesa Grapho Group Oy para pesquisa e desenvolvimento da versão em português do Brasil.

O MEC informou que investiu cerca de R$ 1,5 milhão em publicidade, com produção de filme e divulgação. “A adesão de professores e famílias é central para a efetividade da iniciativa, e o histórico de disponibilização do aplicativo em diversos países aponta para a importância do investimento em publicidade de massa para alcançar o público-alvo”, diz a pasta em nota.

O programa estará disponível para download gratuito e não demandará conexão para o uso. Não há previsão de licenciamento para professores acompanharem online a evolução das crianças, o que não é considerado crucial para a ferramenta, mas o Instituto do Cérebro comandará um estudo de impacto ao longo de 12 meses, prazo de validade do contrato – o governo pretende renovar sua licença.

O Graphogame tem foco em crianças entre os quatro e os nove anos. O jogo envolve uma metodologia voltada para o desenvolvimento da consciência dos sons da língua oral e sua relação com as letras, processo classificado com instrução fônica, em ambiente que, além de lúdico, também adaptativo (quanto mais a criança acerta, mais difícil fica o jogo).

O uso estará associado à política de alfabetização do MEC, chamada Tempo de Aprender. O MEC deve promover conexões do conteúdo do jogo com os materiais de apoio aos professores.

“A ideia não é substituir o professor”, diz o professor Augusto Buchweitz, do Instituto do Cérebro e integrante de uma rede mundial do projeto. “A criança, jogando, vai aprender, mas o maior efeito tem sido encontrado nos estudos quando ele é integrado a programas de alfabetização das escolas”.

Lançada em 2019, a política de alfabetização do MEC foi criticada por especialistas e secretários por favorecer apenas uma metodologia, o chamado método fônico, e ser desenvolvida com pouco diálogo com as redes e professores.

Ao longo deste ano a pasta intensificou a conexão com secretarias, afastando-se de uma preconização metodológica, e alcançou a adesão de 4.403 redes públicas.

Ações mais efetivas para implementação, como formação de professores e transferências para pagamento de assistentes de alfabetização, ficaram para o próximo ano. A pasta já computa, no entanto, 275.125 professores inscritos em curso online do Tempo de Aprender.

O professor Heikki Lyytinen, da Universidade de Jyväskylä, da Finlândia, é um dos responsáveis pelo Graphogame. Ao jornal Folha de S. Paulo ele diz que o jogo consegue resultados de aprendizado mesmo sem professores conectados, embora essa configuração possa ter maior sucesso. Espera-se um engajamento no jogo em torno de 15 minutos por dia, e o uso contínuo é considerado essencial.

Segundo Lyytinen, a compreensão atual dos cientistas do cérebro é de um aprendizado baseado em associações. “No Graphogame, aplicamos este modo de aprendizagem mais direto: construção de conexão entre unidades faladas e escritas”, diz.

“Os escritos que são consistentes no nível do som das letras exigem do aluno que armazene os sons das letras e invente como soar na ordem das letras. Assim, qualquer som que possa ser pronunciado letra por letra significa que eles também podem aprender palavras que não conheciam anteriormente. O contexto geralmente os ajuda a elevar seu vocabulário.”

Para Luiz Garcia, presidente da Undime (que representa os secretário municipais de Educação), a busca por ferramentas tecnológicas é importante, mas isso tem de ser acompanhado de uma ações inclusão digital.

“É fundamental ampliar a acessibilidade, de internet e também de equipamentos. Mesmo com esse recurso offline é importante que as crianças tenham acesso a equipamentos e não se aprofunde o fosso da desigualdade”.

O acesso ao jogo será um desafio para o programa. Cerca de 250 mil alunos dos anos iniciais do ensino fundamental (1º ao 5º ano) precisam apenas de um chip para se conectar à internet. Mas outros 650 mil necessitam também do equipamento, seja celular, tablet ou computador, segundo nota técnica do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada), de agosto.

Essa exclusão é mais marcante nas áreas rurais, de interior, entre as pessoas de baixa renda e negros. Os resultados da última avaliação de alfabetização mostraram, por exemplo, forte desigualdade nos resultados.

O MEC tem tido baixa execução orçamentária nas ações voltadas à educação básica, inclusive no programa para fornecer internet nas escolas. Segundo a pasta, o plano inclui “disponibilização de pacotes de dados na modalidade Mobile WiFi em locais de grande circulação para download gratuito do jogo”.

O ministério afirma que tem o interesse de dar continuidade no projeto após os 12 meses de contrato, mas é necessário “analisar o contexto” para subsidiar futuras decisões.

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