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Decisão do Supremo barra cobrança que deixaria 5G mais caro no país

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O STF (Supremo Tribunal Federal) proibiu nesta quinta-feira (17) a cobrança pelo uso de vias públicas para instalação de infraestrutura e rede de telecomunicações. Com a decisão, os ministros evitaram o aumento nas contas de consumidores que sentiriam o repasse desses custos pelas concessionárias de serviços como energia, água e telefonia.

Somente para as operadoras de telecomunicações, o estoque estimado de cobranças dessa natureza é de quase R$ 4 bilhões, segundo a LCA Consultores. Foram taxas pela liberação de novas antenas de celular ou pela instalação de fibras ópticas para turbinar as conexões das residências à internet, por exemplo.

Por 10 votos a 1, prevaleceu o entendimento do relator, ministro Gilmar Mendes, de rejeitar ação da PGR (Procuradoria-Geral da República), de julho do ano passado, que buscava invalidar trecho da Lei Geral das Antenas, de 2015, que trata da matéria. Ficou, portanto, reconhecida a constitucionalidade do dispositivo legal.

A norma contestada pela PGR proíbe que estados, Distrito Federal e municípios cobrem das concessionárias pelo direito de passagem em vias e outros bens públicos de uso comum na instalação de infraestrutura e redes de telecomunicações.

Em muitos casos, prefeituras já vinham abrindo mão da cobrança, especialmente das companhias de energia e telefonia. Ainda segundo a LCA, com essa mudança de comportamento, as teles deixaram de pagar cerca de R$ 547 milhões por ano. Nas demais concessionárias, essa redução de custo anual foi de R$ 223 milhões.

Caso a isenção fosse derrubada pelo Supremo, os consumidores teriam de arcar com o repasse dessas cobranças em suas faturas mensais de energia, telefonia, dentre outros serviços.

Contrária à isenção, a PGR argumentou que a norma viola a autonomia dos “entes federativos”, pois retira deles eventual receita que poderia ser aplicada nos serviços públicos locais.

É usual, defendeu a Procuradoria, o pagamento pelo uso privativo de bem público como elemento de atividade econômica ou comercial.

Gilmar sustentou que a medida é positiva para a expansão tecnológica e para levar rede de fibra óptica, necessária para instalação de internet, aos locais mais distantes do país.

O magistrado argumentou que a procedência da ação da PGR tornaria inviável para empresas privadas levar internet a cidades pequenas e com pouco potencial rentável.

“O custo anual [para as empresas] seria da ordem de R$ 11 mil por quilômetro. Em termos práticos, se uma empresa de telecomunicações decidisse levar rede de fibra óptica de Cascavel [PR] para o distrito de Juvinópolis, a cobrança feita pelo Estado seria 50% superior ao faturamento potencial para prestação do serviço naquela região”, disse.

Segundo o ministro, a restrição imposta ao direito de propriedade de estados, municípios e concessionárias de rodovias e outros espaços públicos foi feita de forma proporcional.

“A cobrança do direito de passagem, mesmo que de maneira uniforme pelas diferentes esferas administrativas, já elevaria o custo ao consumidor final, dificultando o acesso ao serviço e na contramão da política nacional de telecomunicações”, disse.

O ministro sustentou que “existe forte lógica econômica” na extensão da gratuidade e que foi uma política legítima aprovada pelo Congresso.

Os ministros Kassio Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello e Luiz Fux acompanharam Gilmar.

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Ao apresentar o único voto divergente, Edson Fachin avaliou que a norma questionada retira das administrações estaduais e municipais “as prerrogativas de utilização econômica de seus bens”.

Antes do debate entre os ministros, houve a manifestação de entidades interessadas na controvérsia.

O advogado Gustavo Binenbojm usou a tribuna em nome da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias e defendeu a tese da PGR.

Desde 2015, as concessionárias de estradas não podem mais cobrar das operadoras de telefonia pela passagem das fibras ópticas ao longo das vias.

“O dispositivo criou uma vantagem competitiva às empresas de telecomunicações em desfavor das concessionárias de rodovias que fazem a terraplanagem, que adoçam os taludes e que constroem essa infraestrutura”, disse Binenbojm.

A Associação Brasileira dos Produtores de Soja defendeu a legislação. Segundo seu advogado, Lucas Mayall, a invalidação da lei teria “efeito catastrófico” para a produção rural no país.

“Hoje, um dos principais fatores da produtividade, da grande vantagem competitiva que o Brasil ostenta decorre da utilização de ferramentas de alta tecnologia no campo, como ferramentas de geolocalização de alta precisão, ferramentas de controle de estoque que usam internet das coisas. A conectividade no campo é fundamental”, disse Mayall.

Na visão do advogado, a invalidação da legislação faria com que recursos que seriam usados para levar a tecnologia 5G a todo o país fossem para a aquisição do chamado direito de passagem.

As teles estimam que, para garantir velocidades até cem vezes superiores à do 4G, será preciso instalar até dez vezes mais antenas do que já existe em operação no país. Antes, para cada antena, era preciso fazer um pedido para cada prefeitura.

“Estávamos otimistas e o setor de telecom vê nessa decisão a confirmação de que o acesso à internet é fundamental para o desenvolvimento dos municípios e que sua ampliação deve ser incentivada por legislações modernas e que estimulem o avanço de novas tecnologias, como o 5G e a Internet das Coisas”, disse Marcos Ferrari, presidente da Conéxis, associação que representa as operadoras de telefonia.

“Num momento em que a pandemia mostrou o quanto é fundamental a conectividade, seria um retrocesso onerar ainda mais um investimento que é o alicerce da economia do futuro.”

Para as operadoras de telefonia, além de onerar consumidores, a cobrança atrasava os projetos. Nos bastidores, as empresas sempre reclamaram que os municípios se aproveitavam da situação para cobrar valores exorbitantes. Caso contrário, as obras não eram autorizadas. Houve casos na cidade de São Paulo, em que a espera para a instalação de um antena de celular levou mais de cinco anos.

Com o entendimento de que a internet passou a ser um bem valioso para a população e para a economia das cidades, muitas prefeituras deixaram de cobrar pelo direito de passagem.

As controvérsias com os municípios que continuavam com a cobrança foi extinta em setembro do ano passado. Com planos de realizar o leilão do 5G neste ano, o presidente Jair Bolsonaro editou um decreto que reduziu poderes das prefeituras que dificultavam a instalação de antenas de celular.

Para as teles, este era um dos maiores entraves para o avanço da cobertura de telefonia no país e uma das principais barreiras para a chegada da telefonia de quinta geração.