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Em nova defesa, deputado que apalpou colega coloca toque em dúvida e nega importunação sexual

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Os advogados de Fernando Cury (Cidadania), deputado estadual que apalpou a colega Isa Penna (PSOL) no plenário da Assembleia Legislativa de São Paulo em dezembro, apresentaram nova peça de defesa ao conselho de ética na qual colocam em dúvida se houve o toque flagrado pelas câmeras da Casa.

O processo em que Isa acusa Cury de importunação sexual foi aceito pela comissão de ética no último dia 10. Com isso, o deputado teve o prazo de cinco sessões para apresentar a defesa, período que se encerrou nesta quinta (18), quando a peça foi entregue à Assembleia.

O processo, relatado pelo deputado Emidio de Souza (PT), pode levar à cassação do deputado ou pode resultar em penas menores, como suspensão, censura e advertência -ou pode ainda ser arquivado. Eventual suspensão ou cassação precisam ser aprovadas não só no conselho, mas pelo plenário.

O deputado também é investigado pelo Ministério Público de São Paulo e é alvo de um processo de expulsão no Cidadania.

Cury já havia apresentado uma defesa prévia, mas, diante do recebimento do processo, a nova peça agora entra no mérito dos fatos e afirma que “não ocorreu toque ’em regiões de maior intimidade’ da douta deputada Isa Penna, muito menos ‘toque forçado'”.

Para chegar a essa conclusão, o advogado de Cury, Roberto Delmanto Junior, contratou um perito para analisar o vídeo. O laudo levanta a possibilidade de não ter havido toque, ou seja, que haja uma confusão devido à sobreposição na imagem.

“Não há aspectos ou elementos técnicos que permitam afirmar que houve apalpação ou ‘encoxada'”, diz o laudo do perito Edmundo Braun, professor da academia de Polícia Civil, perito colaborador do Ministério Público de São Paulo, ex-diretor da Associação Brasileira de Combate à Falsificação e ex-perito judicial.

Delmanto Junior faz distinção entre o que entende ser toque e apalpação, afirmando que no segundo caso há pressão, o que, para a defesa, não se aplica ao caso.

A perícia e o advogado afirmam, porém, que pode ser admitida a hipótese de toque, mas nesse caso de forma leve e rápida.

O principal indício apontado no sentido de que não ter havido apalpação é o fato de a deputada aparentemente não reagir à mão do deputado na lateral direita do seu corpo. Isa afasta Cury quando o sente se aproximar por trás e pela esquerda, logo após o toque.

“Se houve um toque na região lateral direita (cintura) ele ocorreu sem pressão, de forma tão leve, que no momento não foi ao menos percebido pela deputada Isa Penna, que não esboçou uma mínima reação para o seu lado direito”, afirma o documento.

“A simples sobreposição da imagem da mão, ilude o observador de que tenha ocorrido toque no seio. Contudo, diante da inexistência de profundidade na imagem (perspectiva) e da ausência de reação da deputada, não se identifica ter havido toque nesta região”, diz a perícia.

“Admitindo-se apenas por hipótese que houve contato da mão direita do deputado Fernando Cury com a lateral direita da deputada Isa Penna, esse teria ocorrido sem qualquer pressão e restaria, apenas, sobre o tecido do seu traje”, completa.

No entendimento do perito, a suposta falta de reação mostra que a deputada não sentiu a mão de Cury. Isa, no entanto, já afirmou em depoimentos ter sentido o toque na lateral e na parte traseira do corpo.

O vídeo mostra que a deputada empurra Cury logo após sua aproximação e demonstra irritação.

“Não houve intenção de assediá-la sexualmente, não tendo havido má-fé, intenção libidinosa nenhuma. […] Por essas razões, não houve a consumação do crime de importunação sexual. […] Igualmente pelos motivos acima referidos, não ocorreu violação do decoro parlamentar”, afirma a defesa.

O código penal define importunação sexual como “praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro”. O advogado de Cury afirma não ter havido ato libidinoso.

A defesa afirma que não pretende minimizar os fatos, mas “demonstrar sua exatidão”.

“Como se observa, a mão direita do deputado não se sobrepôs ao seio da nobre deputada Isa Penna. A sua mão estava na altura das costelas, na lateral de suas costas. As imagens devem ser vistas com cautela, sendo nítido o fato de que, quando há a leve e superficial aproximação, a sua mão direita não toca e muito menos ‘apalpa os seios’ da nobre deputada. […] Fica claro, aqui, que o toque foi na costela, sendo o alegado toque na lateral do seio, portanto, um fato não intencional.”

A perícia analisa ainda toda a sessão em que ocorreu o assédio para afirmar que Cury tem por hábito abraçar os deputados da Casa. O laudo pontua o contato físico do deputado com outros nove colegas naquela noite e traz ainda diversas fotos de Cury em campanha, abraçando homens e mulheres.

Na sessão, por exemplo, Cury dá tapas nas costas de Barros Munhoz (PSB), abraça Coronel Telhada (PP) de lado e abraça por trás André do Prado (PL). A única mulher, além de Isa, em que o deputado toca é Carla Morando (PSDB), de quem ele se aproxima pela frente e toca o cotovelo.

Segundo Isa, Cury estava embriagado devido a uma confraternização de fim de ano entre os deputados. O relato foi corroborado por outros parlamentares ouvidos pela Folha.

A defesa afirma que abraçar as pessoas é algo característico de Cury, que não o faz por má-fé.

“Ocorreu somente uma aproximação seguida de um abraço superficial e fugaz sem nenhuma má intenção, à exemplo inexistência de má-fé ou malícia com todas as interações do defendente com outros 9 deputados.”

“Como demonstram estudos sociológicos, o contato físico é ínsito à cultura brasileira que, por esse motivo, é inclusive objeto de preocupação para brasileiros que venham a trabalhar no exterior, causando constrangimentos e por vezes sendo mal interpretado como ‘assédio'”, afirma Delmanto Junior.

O advogado do deputado também aponta o que entende serem contradições em falas e depoimentos de Isa e afirma haver politização do caso.

“Antes de que se venha ‘acusar’ essa defesa de que se estaria buscando ‘desacreditar a vítima’, de que esta seria uma ‘velha manobra conhecida de machistas em uma sociedade patriarcal’, ressalte-se que afirmações como essa são totalmente descabidas”, diz Delmanto Junior na peça.

A primeira contradição levantada é no depoimento ao Ministério Público, em que Isa afirma desconhecer Cury, não saber seu nome e nunca ter falado com ele. Naquela sessão, contudo, houve um momento de conversa entre Cury, Isa e Alex de Madureira (PSD), pouco antes do assédio.

As demais se referem a declarações de Isa. No Instagram, a deputada escreveu “apalpa meus seios”.

Ao Ministério Público a deputada afirmou: “Ele chegou por trás né, isso foi o que eu senti, né como eu estava de costas eu não tinha visto ainda a movimentação do Alex de Madureira e dele. Eu senti primeiro o toque aqui na lateral. Aqui na lateral onde fica a costela, e por consequência a lateral do peito né, a lateral do meu seio. Então nesse momento mas muito de leve, muito rápido, porque na hora que eu senti eu já tirei a mão dele”.

A defesa traz ainda entrevista de Isa à Folha, em que ela afirma “não falei que meu seio foi apalpado”, mas em seguida diz que fo i, sim, tocada e “eu fui assediada”.

A defesa resgata ainda a atuação parlamentar de Cury, que está no segundo mandato, afirmando que ele “instituiu a Semana de Prevenção, Controle e Combate ao Diabetes”, criou a lei que obriga um cardápio de merenda especial na rede pública para diabéticos e a que cria o Sistema Paulista de Cadastro de Doação de Medula Óssea.

Como na defesa prévia, o advogado reafirma questões de procedimento. Pede que as testemunhas de defesa e o perito sejam ouvidos, assim como Cury e o advogado, mas esses por último, e afirma que os deputados do PSOL são suspeitos para julgarem o caso -algo não acatado pelo conselho de ética.

Por fim, Delmanto Junior também apela que os deputados levem em conta não apenas o fato objetivo, mas aspectos subjetivos, ou seja, o conjunto da vida de Cury.

“Diferentemente do que se busca disseminar caluniosamente, inclusive por motivação política, que o deputado Fernando Cury não respeitaria as mulheres, em toda a sua vida, particular e pública, nunca teve qualquer acusação, de quem quer que seja, sobre comportamento indevido, muito menos de ter assediado sexualmente quem quer que seja”, diz.

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