Economia

Risco fiscal elevou “pass-through” do câmbio, diz Kanczuk

O impacto do risco fiscal no Brasil sobre a taxa de câmbio elevou o repasse da desvalorização do real à inflação desde março de 2020, disse o ​​diretor de Política Econômica do Banco Central, Fabio Kanczuk, citando que a moeda brasileira sofre adicionalmente com o movimento de “reflação” no mundo, que pode tornar o cenário especialmente desafiador para o Brasil.

Pelo número “típico”, o chamado “pass-through” indicaria aumento de 65 pontos-base em um ano na inflação em decorrência de uma depreciação de 10% da taxa de câmbio. Mas o aumento do risco fiscal desde março de 2020 aumentou o repasse por esse canal e aumentou a inflação em 400 pontos-base.

“Essa é a surpresa que tivemos em termos de choque no Brasil. É enorme”, disse.

O real desvalorizou 19,7% ante o dólar desde o fim de fevereiro de 2020. Desde o começo do ano passado, o declínio é de 28%.

O diretor repetiu falas de outros integrantes do BC e disse que a inflação deve, contudo, ser temporária. Também por esse entendimento, ele rechaçou avaliações de que a autarquia teria alterado o modo de intervenção no mercado de câmbio com objetivo de amenizar a pressão inflacionária.

“Não há nenhuma chance de mudarmos o jeito como pensamos sobre (atuação no câmbio)”, disse Kanczuk. “Se as pessoas pensarem que vamos atuar no câmbio pensando em inflação, em controlar a inflação que não seja via taxa de juros, vemos isso como um grande erro”, completou.

Na primeira metade de março, o mercado se mostrou surpreso com alguns leilões de câmbio realizados pelo Banco Central, pelo volume, frequência e, sobretudo, “timing” das operações –já que o BC chegou a vender dólares com a moeda já em queda.

Em evento virtual promovido pelo Goldman Sachs, Kanczuk reconheceu, contudo, que a alta das commodities e a depreciação do real são as maiores fontes de elevação sobre a inflação.

Nesse ambiente, ele destacou que o chamado “reflation trade”, com seu consequente impacto de alta nos rendimentos dos títulos do Tesouro norte-americano, se tornou uma questão “relevante” para a política monetária brasileira.

O “reflation trade” –quando investidores adotam estratégias voltadas a ativos que tendem a se valorizar em tempos de maior inflação vinda após recuperação de crises econômicas– tem sido o principal tema dos mercados internacionais desde o começo do ano, e, segundo analistas, assim deve permanecer.

“Estamos atentos ao que está acontecendo nos rendimentos dos Treasuries de dez anos, especialmente nas inflações implícitas nos Estados Unidos”, disse Kanczuk, acrescentando que o mercado se questiona sobre os desdobramentos desse movimento, mas que ninguém sabe.

“O impacto disso em termos de política monetária é relevante, e achamos que o ambiente para mercados emergentes, especialmente para Brasil, pode se tornar um pouco mais desafiador com o tempo se você for para esse cenário de inflação mais alta.”

O rendimento do Treasury de dez anos –referência global para investimentos– saiu de cerca de 0,91% no fim do ano passado para quase 1,78% no término de março, uma disparada de 85 pontos-base que levou a taxa para máximas em 14 meses e chacoalhou os ativos financeiros no mundo.

O diretor aproveitou para ponderar que esse fenômeno tem afetado moedas emergentes de forma geral e ajuda a explicar por que as divisas não estão apreciando em consonância com os ganhos das matérias-primas –uma correlação clássica.

“Acho que a melhor explicação para isso é o que tem acontecido com o ‘reflation trade’ no mundo, que não está causando esse impacto apenas no Brasil, mas em outros mercados emergentes. Essa é uma questão relevante.”

O diretor reiterou que não há compromisso em se fazer uma normalização parcial da política monetária.

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