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Vamos descobrir junto com o vírus qual o perfil da 3ª onda, diz diretor-presidente do Oswaldo Cruz

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Uma terceira onda da pandemia está no radar dos gestores de saúde, mas o impacto da vacinação nos grupos prioritários traz a esperança de que o pior já tenha ficado para trás.

É o que pensa o médico especializado em administração José Marcelo de Oliveira, 54, conhecido por Jota, o novo diretor-presidente do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, que inicia nesta semana a fase de transição e assume oficialmente o cargo a partir de 1º de junho.

“A terceira onda terá um outro perfil. Tem o perfil do comportamento social dos jovens, o das novas variantes e o perfil da vacinação. A gente está descobrindo junto com o vírus qual será esse novo perfil”, diz ele, quem encerrou na última sexta (30) uma gestão de seis anos no A.C. Camargo Cancer Center.

Jota assume a direção do Oswaldo Cruz em um momento de expansão. Em receita, o hospital passou de R$ 493 milhões para R$ 852 milhões, entre 2013 e 2020. No mesmo período, saiu de 327 leitos para 538. Neste primeiro trimestre, foram contratados 400 novos funcionários, quase 10% da força de trabalho da instituição.

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Pergunta – A Prefeitura de São Paulo já trabalha com a possibilidade de uma terceira onda em junho? O hospital está se preparando para isso?

José Marcelo de Oliveira – Essa possibilidade está na cabeça de todo mundo, e a instituição está preparada para isso. Mas a gente ainda não tem um sinal concreto dessa situação [novo repique]. Por enquanto, estamos numa descendente.

O fato de a cidade de São Paulo ter conseguido vacinar bastante gente, especialmente dos grupos de maior risco, mudou o jogo. Um lugar que a gente mede muito é na nossa população de colaboradores. A gente já vacinou mais de 95% deles, e a incidência de internação por Covid é praticamente zero.

Acho que essa dinâmica vai se refletir na sociedade. A gente já começa a ver a redução de mortalidade nos idosos. Quando a gente olha a primeira e a segunda ondas, fica clara a mudança de perfil. E a terceira onda terá outro perfil. Tem o perfil do comportamento social dos jovens, das novas variantes e o perfil da vacinação. A gente está descobrindo junto com o vírus qual o perfil.

O pior já passou?

JMO – Penso que sim. A gente já conhece minimamente a condição clínica da Covid, a doença, mecanismo de transmissão. E já tem uma forma de prevenção efetiva, que é a vacinação. Os médicos já sabem tratar com mais efetividade as complicações. Por isso, o índice de mortalidade está estável, caindo. Entre os desafios estão manter um suprimento de vacina para ter a cobertura necessária e rápida e o enfrentamento do impacto econômico provocado pela pandemia.

Há um cansaço coletivo do distanciamento social, de uso de máscara…

JMO – Sim, há um cansaço do comportamento preventivo, que é máscara, álcool, higiene, distanciamento, mas, por outro lado, tem uma certeza de várias pessoas de que isso funciona.

Estamos há mais de um ano assim e, independentemente das informações truncadas, essa é uma certeza, funciona muito. Acho que vamos ficar nesse abre e fecha setorizado. É difícil pensar em terceira onda no Brasil como um todo. O país é muito diverso.

E as demandas não Covid? As pessoas estão perdendo o medo e retomando tratamentos?

JMO – Felizmente, sim. As pessoas estão se cuidando mais, está diminuindo o número de adiamentos e postergações. Não só aqui, mas o mercado como um todo sente isso.

O tratamento eletivo pode até ter uma data combinada, mas precisa ser logo, principalmente no contexto oncológico. O fluxo no Oswaldo Cruz e nas outras instituições que se prepararam é muito seguro; pacientes com andares dedicados à Covid, as coisas não se cruzam. Então, tendo necessidade, é seguro estar em ambiente hospitalar.

Uma publicação da Anaph (Associação Nacional de Hospitais Privados) prevê uma série de mudanças da forma de cuidar no pós-pandemia, especialmente o uso da telemedicina. Como será isso no hospital?

JMO – Aceleramos muito a telemedicina no contexto das consultas para avaliação de sintomas, queixas mais simples relacionadas à Covid ou não, ferramentas de triagem para identificar casos de maior gravidade.

Também estamos com o programa Hospital Alemão Oswaldo Cruz em casa, que é a possibilidade de realizar exames e consultas no domicílio. E também de reabilitação por meio remoto.

É uma evolução do modelo de cuidado. O hospital fisicamente é um centro de alta complexidade, mas precisa ter uma continuidade de suporte de cuidados para o paciente reabilitar. Essas ferramentas [digitais] se tornaram muito poderosas para isso. Têm baixo custo, o paciente pode fazer num momento de maior flexibilidade para ele. Tendo essa interação, o indivíduo se engaja mais no tratamento, e a chave da recuperação plena é o indivíduo fazer a parte dele.

Assim como o Oswaldo Cruz, muitos hospitais implantaram pronto atendimentos virtuais durante a pandemia. Isso veio para ficar?

JMO – Sim, é uma forma de triar pacientes que precisam vir ao pronto-socorro e aqueles que não precisam. É uma ferramenta que deve abarcar outras condições clínicas, não só a Covid. É um potencial enorme de melhora do cuidado para o país.

Hoje há uma demanda enorme por atendimentos de saúde mental e o Oswaldo Cruz recentemente lançou um programa que atua nas empresas. Como funciona isso?

É uma plataforma de saúde mental que treina profissionais dentro de empresas para identificar casos de problemas mentais entre os colaboradores. É o primeiro curso no Brasil voltado para a formação de socorristas de saúde mental nas empresas.

O hospital tem adotado um novo modelo de remuneração na unidade Vergueiro. Como está isso hoje?

JMO – Em 2017, o Oswaldo Cruz adotou no antigo Hospital Santa Helena, um espaço com mais de 200 leitos, o conceito de remuneração com previsibilidade. Todo custo do procedimento está dentro dele.

Hoje são mais de 1.200 bundles [pacotes] de todas as especialidades [exceto pediatria e obstetrícia] adotados na Vergueiro.

Se aquele paciente consumiu mais ou menos, o custo do serviço já está contratado e combinado. Se o hospital for além do custo, ele tem que assumir parte dele. Se for mais eficiente, ele tem uma margem um pouco maior. Um risco compensa o outro e, num volume grande, tem benefício para os dois stakeholders [partes interessadas, no caso, plano de saúde e hospital].

É uma demanda do mercado devido ao custo crescente da saúde, e isso aumentou muito no ano passado, com a pandemia. Economicamente, o país ficou mais pobre, houve um downgrade [rebaixamento] dos planos de saúde e ter soluções com uma relação custo e efetividade maior é importante.

Falava-se em um risco de que as instituições pudessem optar por uma assistência mais barata para economizar. Isso já foi superado?

JMO – Sim, os indicadores de qualidade e segurança são acompanhados na lupa. Não se não abre mão de qualidade e segurança e há indicadores para isso, como os de satisfação do paciente e taxa de infecção. O painel de indicadores é muito duro, não dá para escapar.

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RAIO-X

José Marcelo de Oliveira, 54

Formado em medicina, com doutorado em radiologia clínica pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e MBA em administração de empresas pela FIA (Fundação Instituto de Administração), Oliveira ocupava o cargo de diretor-geral do A.C.Camargo Cancer Center desde 2015. Antes, havia atuado por 22 anos no Grupo Fleury em diversas posições executivas.

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