Agro

Brasil arranca alguns cafezais queimados por geadas; grãos podem ocupar áreas

Produtores de café atingidos em julho pelas geadas mais severas em 27 anos já estão arrancando as lavouras sem chance de recuperação ou localizadas em áreas mais baixas e frias, em movimento ainda pontual, mas que indica efeitos do clima para as próximas safras do Brasil.

O arranquio do café, que pode dar lugar a novas mudas ou em alguns casos ser substituído por culturas como milho, soja e feijão, mostra também o desânimo daqueles que colheram pouco em meio à seca em 2021, após o cafezal ter sido podado visando uma maior colheita em 2022, o que não será possível com as geadas.

A erradicação, ainda restrita a algumas áreas do maior produtor e exportador global de café, ocorre antes mesmo da chegada de temporada de chuvas, contrariando recomendação técnica de aguardar a possível brotação nos pés antes de qualquer poda, para que seja obtido um melhor manejo dos danos no cafezal.

“O que já tem de lavoura arrancada, já tem bastante. Já está tudo acumulado nas propriedades. Com o passar do tempo, de cima pra baixo foi morrendo mais”, disse Airton Gonçalves, por telefone, diretamente de Patrocínio, no Cerrado Mineiro, citando casos de propriedades próximas.

Há também lavouras novas atingidas pelas geadas que serão replantadas ou substituídas por cereais. Cafezais de produtores não tradicionais também estão mais propensos a virar plantação de milho, soja ou feijão, o que poderia reduzir a cultura cafeeira em regiões tradicionais de Minas Gerais.

“Vai ter muita área que vai migrar para grãos. Um amigo meu, de 350 hectares, vai arrendar parte para soja”, disse Gonçalves, lembrando que um colega atingido pelas geadas chegou a chorar sob o pivô de irrigação, ao ver os efeitos do frio mais intenso para os cafezais desde 1994.

O produtor disse que cafeicultores como ele, que estão há mais tempo na atividade, relutam em trocar de cultura, mas não é o caso daqueles que têm no café uma segunda fonte de renda e são novos na atividade, como médicos e empresários. “Esses que entraram há pouco tempo desistem, não voltam mais”, comentou.

Gonçalves citou um colega da região que estava se preparando para uma safra maior no ano que vem, mas “queimou tudo, em torno de 150 mil pés, vai ter que arrancar”.

Ele próprio disse que avalia a erradicação de 30 mil pés, mas aguarda para saber qual será a resposta da brotação, além de avaliação do seguro rural.

“O cara do seguro vai determinar o que fazer em cada área. Se eu discordar da orientação dele, eu abro mão do seguro e faço o que eu achar melhor”, acrescentou ele, projetando uma redução de 75% na sua safra de 2022, para 1.200 sacas de 60 kg.

CAFÉ NOVO AFETADO

O engenheiro agrônomo José Braz Matiello, da fundação de pesquisa Procafé, confirmou que alguns produtores já estão se antecipando com a erradicação das árvores afetadas.

Na avaliação dele, esse processo deverá se concentrar mais em áreas mais baixas e frias, também sujeitas a mais doenças devido à maior umidade, e nos pés mais novos.

Mas ele considera prematuro dizer quanto será arrancando.

“Às vezes em lugar muito no fundo… onde de forma recorrente está queimando, aí tem muita gente que vai arrancar e plantar uma cultura anual, milho, soja, feijão…”, disse ele, que recebeu vídeos mostrando escavadeiras arrancando o cafezal.

Já o agrônomo Adriano Rabelo de Rezende, coordenador técnico da cooperativa Minasul, concorda que a situação só ficará mais clara quando as chuvas chegarem, o que explica a recomendação técnica para produtores aguardarem na maioria dos casos.

“Em áreas mais frias, lavouras novas, que provavelmente o produtor teria que replantar, aí em alguns casos sim o produtor pode optar por entrar com cereais, não vai plantar de novo em áreas mais planas e mais baixas.”

Apesar das orientações, o produtor Mário Alvarenga já iniciou os trabalhos de poda para tentar agilizar os processos que poderão impulsionar a produção em 2023, dependendo da intensidade do corte.

“Já tem bastante gente podando café. Eu estou podando. Como a chuva vai demorar, estamos fazendo muita análise, talhão a talhão”, disse ele, destacando que o trabalho é criterioso para separar aqueles pés que morreram. As chuvas de primavera começam a chegar em setembro, sazonalmente.

“Estamos vendo onde houve morte mesmo (da árvore)… Os que já se sabe que estão vivos, já iniciei o processo de poda”, disse, argumentando que o trabalho agora lhe permite sair na frente, pois vai “arejar mais a planta, vai receber mais luz”, diante da expectativa de um ano complicado em termos de manejo.

Ele disse que mesmo as áreas que não foram queimadas pelas geadas vão produzir menos no ano que vem, devido aos efeitos da seca e às baixas temperaturas por vários dias, o que permitiu também o aparecimento de doenças típicas do frio.

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