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Mesmo com metade da duração, feira de arte holandesa fatura milhões

MAASTRICHT, HOLANDA (FOLHAPRESS) – Quando o coronavírus obrigou uma das maiores feiras de arte do mundo a fechar as portas quatro dias antes do previsto, no dia 11 de março, os únicos que lamentaram foram os visitantes de última hora.
O movimento, de 28 mil pessoas, foi 20% abaixo das médias diárias anteriores, mas os principais negócios já estavam garantidos na Tefaf Maastricht 2020.
É nos primeiros dois dias que museus do porte de Louvre, Metropolitan e MoMA, o Museu de Arte Moderna de Nova York, assim como os colecionadores bilionários, têm acesso restrito aos 30 mil metros quadrados -equivalente a três quadras- em que 280 galerias de 20 países expõem pinturas, esculturas, antiguidades, jóias, gravuras, arte tribal e obras de design.
Quando a exposição abriu para o público, no dia 7, retratos de são Jerônimo e de santa Clara -óleos de Antônio Mouro (1517 – 1577)- já haviam trocado de mãos por EUR 3 milhões (mais de R$ 17 milhões). Um bronze do imperador romano Lucio Vero, do século 2, foi vendido por EUR 950 mil (R$ 5,5 milhões), e uma tela da série “Diálogo” pintada no ano passado pelo minimalista coreano Lee Ufan, por EUR 500 mil (quase R$ 3 milhões).
“Abaporu 3”, esboço da tela da modernista brasileira Tarsila do Amaral, disputava os olhares com concorrentes de peso: Van Gogh, Picasso, Jean Dubuffet e Marc Chagal, para ficar na primeira metade do século 20. O quadro foi vendido logo no primeiro dia, para um colecionador privado europeu, não identificado, e por um valor milionário, não revelado.
Sigilo sobre o comprador é uma das regras do negócio, e são raros os preços divulgados. “Mas todo mundo sabe. Basta ver quanto o MoMA pagou no ano passado”, diz o marchand colombiano León Tovar, que negociou a obra. Em 2019, o museu nova-iorquino comprou “A Lua”, tela de Tarsila, por valor também não revelado, mas estimado em US$ 20 milhões, cerca de R$ 75 milhões à época.
Há normas bem mais estritas: nenhuma obra entra na feira sem passar por microscópios, raiox-X fluorescentes, exame minucioso de um comitê científico e atestado de “ficha limpa” -as peças são verificadas nas listas de desaparecidas da Interpol e na lista vermelha do Icom, o Instituto Internacional de Museus.
Tapetes orientais precisam ser tecidos antes de 1800, livros e manuscritos, anteriores a 1850, talheres feitos depois de 1870 não entram, e ícones gregos devem ser no máximo de 1900. Nos colares, brincos e anéis, são proibidos diamantes de até dois quilates e pérolas com menos de 30 gramas.
Mas o item indispensável para atrair os colecionadores e museus mais ricos do mundo a essa cidade de 120 mil habitantes a 211 quilômetros de Amsterdã, já na fronteira com a Bélgica, é a exclusividade. Nenhuma obra exibida na Tefaf pode ter sido vista em público nos cinco anos anteriores.
Depois que os convidados VIP encerraram as compras, o evento abre para quem se dispuser a pagar EUR 40, ou cerca de R$ 200.
É o dobro do que cobra Rijksmuseum, museu nacional holandês. Ao mesmo tempo, isso garante um acesso impossível em outros locais de exibição. A Folha ficou a centímetros de uma urna grega de 565 anos antes de Cristo, sem caixa de vidro em volta para fazer reflexo, e poderia ter beijado, se quisesse, uma pequena escultura em forma de gato da deusa egípcia Bastet, do século 9 a.C.
Não há filas nem aglomerados em frente aos artistas mais famosos. Maior que a frequência às galerias era só o movimento nos cafés, com ostras por EUR 5 (quase R$ 30) a unidade e champanhe por EUR 20 (mais de R$ 100) a taça.
É um público que até desfila Chanel e Zegna, mas passa apressado pela delicada gravura de uma cortesã desenhando as sobrancelhas (“Mayuzumi”, de Ito Shinsui) ou a exuberante águia americana de Andy Warhol enquanto perde minutos tirando selfies no saguão de entrada, onde milhares de flores naturais formavam um painel de sete metros de altura.

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