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No livro que inspirou 'Killing Eve', Villanelle é ainda mais fashionista e psicopata

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Eve é uma agente entediada do MI5, serviço secreto britânico, com uma obsessão pouco saudável por assassinas mulheres.
Villanelle trabalha como matadora de aluguel numa misteriosa organização criminosa, e adora roupas de grife e sexo – embora pense com frequência que nenhum orgasmo se compara ao êxtase de matar alguém.
As duas ficaram famosas nas peles de Sandra Oh (a eterna Christina Yang de “Grey’s Anatomy”) e Jodie Comer, nesta ordem, estrelas da série “Killing Eve”, por aqui disponível na Globoplay.
Mas surgiram quatro anos antes, em três novelas auto-publicadas do britânico Luke Jennings. Juntas num único volume, “Codinome Villanelle”, chegaram ao Brasil no mês passado, num e-book da editora Suma.
Jennings, que era crítico de dança antes de enveredar pelos thrillers, diz que não sabe precisar quando as personagens começaram a rondar sua imaginação.
Ele conta que, a princípio, seu objetivo era sobretudo criar uma trama policial diferente daqueles que vinha encontrando no mercado, “masculinas demais, pautadas por gadgets e armas de fogo”.
Daí a ideia de centrar a trama em duas mulheres. “Já tínhamos ouvido falar antes numa detetive mulher, ou numa criminosa. Mas achei que seria interessante se ambas protagonista e antagonista fossem do gênero feminino. Quando você põe duas mulheres fortes e voluntariosas no centro da ação, as preocupações mudam completamente.”
Se Eve não foi bem inspirada em ninguém da vida real, Villanelle tem uma influência longínqua, conta o escritor. É a assassina basca Idoia Lopez Ruano, que matou 23 pessoas – e transou com parte delas – quando atuava no movimento separatista ETA.
O autor conta que pensou imediatamente em Villanelle ao ler sobre uma vez em que Lopez Ruano, distraída com a vitrine de uma boutique, perdeu uma vítima que deveria perseguir.
A anedota ajuda a entender melhor a personagem, que no livro, mais do que na televisão, se mostra capaz de tudo para sustentar a vida de luxo que leva.
“O fato de que ela é uma psicopata significa que ela tem uma noção muito superficial de si mesma. Então os objetos dos quais ela se cerca são muito importantes para esse entendimento”, diz Jennings.
É isso que explica, ele diz, as tantas descrições de roupas do livro, com marcas como Valentino, Miu Miu, Fendi, Hervé Leger. E também o próprio nome de Villanelle, inspirado num perfume fictício que teria sido o favorito da Condessa du Barry.
O misterioso passado da personagem também fica mais claro em “Codinome Villanelle”, com capítulos inteiros dedicados à transformação da selvagem jovem russa Oxana Vorontsova em assassina profissional e parisiense elegante, embora as tramas de livro e série divirjam aqui e ali.
Se o carisma de Jodie Comer faz os espectadores a ignorarem a frieza da assassina, aliás, o livro, ao explorar seus pensamentos, mostra sua incapacidade de sentir quaisquer emoções (embora saiba “simular todas”, diz o narrador) e como ela manipula todos à sua volta.
Apesar das diferenças, Jennings conta que participou intensamente do processo de adaptação para a televisão, iniciado no mesmo ano que ele publicou as novelas. Ao seu lado, tinha uma entusiasmada Phoebe Waller-Bridge, atriz e roteirista que, pouco depois, ganharia o mundo com outra série, “Fleabag”.
“Ela entendeu essas personagens de cara, então estávamos na mesma página desde o início. E foi tudo muito fácil, porque ela via o humor e as possibilidades daquilo”, afirma o escritor. Num artigo para o jornal The Guardian, ele lembrou que Waller-Bridge enviava com frequência perguntas aleatórias sobre as protagonistas, como “o que a Eve realmente quer?”.
Apesar do envolvimento inicial, tanto ela quanto o próprio Jennings deixaram a produção da série depois da primeira temporada – o que explica porque os dois volumes seguintes de “Codinome Villanelle”, a serem publicados pela Companhia das Letras, destoam tanto do produto televisivo.
Por ora, o escritor diz que também deve dar uma folga à assassina para trabalhar num novo projeto.
A reportagem indaga se o “pas de deux” da Villanelle e Eve foi inspirado na experiência de Jennings na dança – além de crítico, ele foi bailarino e coreógrafo por dez anos.
Ele responde que a ideia faz sentido. Mas que, se fosse traçar um paralelo entre as duas atividades, diria que No livro que inspirou série ‘Killing Eve’, Villanelle é ainda mais fashionista e psicopata a própria escrita também exige “um ouvido para musicalidade e para o ritmo”.

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CODINOME VILLANELLE
Onde: e-book Kindle
Preço: R$ 29,90 (239 págs.)
Autor: Luke Jennings
Editora: Suma
Tradutor: Leonardo Alves