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Exemplo de Rogério Sampaio serve como combustível para seleção de judô

TÓQUIO, JAPÃO (FOLHAPRESS) – Na edição de 1º de agosto de 1992, último dia das competições de judô na Olimpíada de Barcelona, a Folha de S. Paulo publicou nota para informar que os brasileiros Rogério Sampaio e Patrícia Bevilacqua competiriam naquela data. “Os dois não têm chance de medalha”, finalizava o texto.

Horas depois, Sampaio aplicava um waza-ri (o segundo golpe mais importante da modalidade) no húngaro József Csák para conquistar o ouro, uma das duas modalidades em que o país foi campeão naqueles Jogos. A outra foi a seleção masculina de vôlei.

Vinte e nove anos depois e atual diretor geral do COB (Comitê Olímpico do Brasil), Rogério Sampaio ouviu previsões parecidas, mas talvez não tão dramáticas, sobre a perspectiva da equipe masculina de judô em Tóquio. Exatamente como fez em 1992, não deu nenhuma importância a elas.

“Não interessa muito o que dizem especialistas, cada atleta que chega a uma Olimpíada tem a sua história. Todos os integrantes da seleção brasileira têm chances de medalha. Eu acredito nisso”, afirma.

Não foi apenas Sampaio quem ouviu comentários do tipo. Judocas classificados para os Jogos também se referiram, em entrevistas à reportagem, a análises sobre as chances de pódio no torneio que começa no Nippon Budokan no próximo dia 23.

“A gente escuta comentários de que não vamos conquistar medalhas, mas eu sempre penso na minha trajetória e na dos atletas do Brasil. E vejo condição em todos para subir ao pódio”, afirma Daniel Cargnin, atleta da Sogipa, que vai lutar em Tóquio na categoria meio-leve, até 66 kg.

“É… A gente ouve, mas não dá atenção. Eu estou pensando só na competição, focado apenas nisso”, reconhece Rafael Buzacarini, do Clube Paineiras do Morumby, classificado para o meio-pesado (até 100 kg).

Se existe a irritação, eles e outros judocas não deixam transparecer. Ao contrário, usam previsões pessimistas como motivação.

“Você escuta ou lê algo que não gosta, mas Olimpíada é Olimpíada. A gente vê muitos casos de atletas de ranking baixo que vão lá e ganham ouro. É uma luta. Quando você acorda no seu dia, ninguém segura. Eu pego isso como motivação. Se estão achando que não, eu vou provar que sim”, analisa Rafael Macedo, também da Sogipa, que vai competir no peso médio (até 90 kg).

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O “acordar no seu dia” serve para definir o que aconteceu com Rogério Sampaio naquele início de agosto de 1992. Ele definiu suas três primeiras lutas por ippon, o golpe mais decisivo do esporte e, com isso, poupou energias para a semifinal e a final. Algo inesperado inclusive para funcionários da Confederação Brasileira de Judô que, um dia antes, diziam que o atleta não tinha chance.

“Em 1992, embora alguns especialistas não vissem assim, eu acreditava estar entre os cinco melhores judocas da minha categoria [até 65 kg]. Eu treinava muito. Sabia da minha capacidade. O lutador contra o qual fiz a semifinal [o alemão Udo Quellmalz], já me era conhecido. Eu havia lutado duas vezes contra ele e ganhado uma. Sabia que tinha condições de vencer”, diz Sampaio.

O judô é um dos esportes em que o Brasil conquista medalhas em Olimpíadas com maior regularidade. A última vez em que o país passou em branco na modalidade foi em Moscou-1980. Depois disso foram 21 pódios.

O masculino, alvo maior da descrença sentida por alguns atletas, ganhou dois ouros, duas pratas e 11 bronzes. A última medalha dourada foi a de Sampaio em 1992. O feminino teve dois ouros e três bronzes, mas as mulheres apenas passaram a competir em Barcelona. Na Rio-2016, o melhor resultado foi de Rafaela Silva, ouro na categoria até 57 kg.

Sampaio usa o próprio exemplo para dizer que quem não vê o potencial da atual seleção masculina é porque não tem as informações necessárias.

“Eu fiquei afastado do judô por dois anos e meio, de outubro de 1989 a janeiro de 1992, mas sempre me enxerguei entre os melhores do mundo. Talvez outras pessoas não vissem da mesma maneira. Eu acreditava que lutaria de igual para igual com qualquer um e é o mesmo que vale agora para os atletas da seleção. Eles podem acreditar [em medalhas]. É possível e é viável”, finaliza.

O último medalhista de ouro do judô masculino brasileiro em Olimpíada fala isso com calma, sem nenhuma raiva.

“Nós temos de encarar tudo como um combustível. Porque sabemos que pode dar tudo muito certo. São poucos os que conseguem uma Olimpíada. Muita gente boa fica pelo caminho”, lembra Eduardo Katushiro (categoria até 73 kg), do Clube Paineiras do Morumby.