Asia

WIDER IMAGE-“Ucrânia brasileira” reza pela pátria ancestral

(Ensaio fotográfico: https://reut.rs/3hRx4Zh)

Por Pilar Olivares

PRUDENTÓPOLIS (Reuters) – Mais de 100 igrejas estão espalhadas pelas ruas de Prudentópolis, no Paraná, muitas construídas em estilo bizantino por imigrantes ucranianos que chegaram à cidade a partir do final do século 19 em tão grande número que o lugar ficou conhecido como “Ucrânia brasileira”. 

Nos últimos dias, após a invasão russa na Ucrânia, chamada por Moscou de “operação militar especial”, as igrejas da cidade ficaram lotadas de moradores devastados por sentimentos de desespero e impotência, rezando por amigos e familiares que estão na Ucrânia. 

A funcionária pública Oksana Jadvizak, de 35 anos, visitou a Ucrânia pela primeira vez em 2008 por meio de uma bolsa de estudos. Ela ainda estava lá em 2014, durante a revolta da Praça Maidan que derrubou o ex-presidente ucraniano Viktor Yanukovich, agora exilado na Rússia. Um de seus professores morreu nesses confrontos, e Jadvizak disse estar horrorizada com a recente ação russa que tem transformado a Ucrânia em uma pilha de escombros. 

“É tão impactante ver os tanques de guerra, os aviões sobrevoando e ouvir meus amigos dizendo que irão lutar”, disse ela em frente a uma igreja bizantina, vestindo a camiseta da seleção ucraniana de futebol e enrolada em uma bandeira azul e amarela do país do leste europeu.

“Vamos rezar para que tudo termine bem”, disse Jadvizak, que é descendente de ucranianos de quarta geração e tem o português como segunda língua. 

Alguns na cidade traçaram paralelos entre a saída de suas próprias famílias da Ucrânia e a fuga dos milhões de ucranianos que se retiraram após a invasão russa.

Nadia Rurak Techy, de 66 anos, uma lojista cujos pais vieram para o Brasil depois de viver o “terror” da Segunda Guerra Mundial, disse temer que a cultura ucraniana seja apagada. 

“Estou perturbada”, disse ela, em lágrimas, dentro de sua loja de roupas. “A Ucrânia não merece isso… Nossa pátria tem que ser livre. Precisa permanecer bonita, como sempre foi.” 

MIGRAÇÃO ECONÔMICA

Imigrantes ucranianos, muitos vindos da região oeste do país, que inclui a cidade de Lviv, começaram a chegar a Prudentópolis em 1896, de acordo com Anderson Prado, historiador da Universidade Federal do Paraná, que estudou as raízes da cidade.

Ele disse que os ucranianos estavam fugindo da extrema pobreza, apenas algumas décadas depois que a Rússia czarista proibiu a servidão. 

No vasto e fértil sul do Brasil, eles encontraram um lar. O país, que havia abolido recentemente a escravidão, estava desesperado em busca de trabalhadores para atuar em suas terras agrícolas, e recrutou europeus ativamente por meio de campanhas publicitárias. 

Segundo Prado, a população de Prudentópolis, que foi batizada em homenagem ao ex-presidente da República Prudente de Morais, manteve laços surpreendentemente próximos com a Ucrânia. Mais de três quartos dos 52 mil habitantes da cidade falam um pouco de ucraniano, sua segunda língua oficial. 

“Os descendentes que vivem em Prudentópolis têm uma conexão fundamental com a Ucrânia”, disse ele. “Eles são muito próximos de seus parentes que ficaram lá, e a grande maioria sonha em voltar ou visitar sua terra de origem.” 

O cirurgião dentista Rodrigo Michalovski, de 31 anos, concorda. Ele faz parte de um grupo de décadas na cidade conhecido como “Irmandade Cossacos”. O clube busca manter laços com a cultura ucraniana por meio de apresentações e danças históricas. Quase todos os membros são católicos e se vestem com roupas tradicionais, mantendo o cabelo e a barba no clássico estilo cossaco. 

“Aprendemos a amar a Ucrânia desde a infância… e carregamos esse amor por toda a nossa vida”, disse Michalovski. “Toda notícia triste sobre a guerra é uma facada no meu peito, no meu coração. Só teremos paz novamente quando a guerra na Ucrânia cessar, quando eu souber que nosso povo está seguro.” 

Com poucas formas de ajudar os ucranianos, Jadvizak, a funcionária pública, disse estar oferecendo todo o apoio possível. 

“Hoje mandei uma mensagem para meus amigos dizendo que se precisarem, minha casa está aberta”, disse ela. “Acho que todos aqui em Prudentópolis, onde 70% da população é de ascendência ucraniana, estão dispostos a abrigar pessoas.” 

Thiago Zakalugne, de 36 anos, mecânico e membro da “Irmandade Cossacos”, compartilha a opinião de muitos em Prudentópolis que não têm como ajudar. Assim como eles, Thiago também deposita sua fé no divino. 

“Cada bomba que cai ali, cada gota de sangue ucraniano derramada é um pedaço do nosso coração que se parte”, disse. “Se eu pudesse, com certeza iria (à Ucrânia), para tentar ajudar de alguma forma… mas a nossa forma de ajudar daqui, agora, é com oração.” 

(Reportagem adicional de Gabriel Stargardter)

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