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Prokofiev no Municipal tem boa execução, mas cenografia é inadequada

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A ópera “O Amor das Três Laranjas”, do russo Sergei Prokofiev, em cartaz no Municipal, se assenta em três aspectos. Em primeiro lugar, o libreto recupera elementos da commedia dell’arte, forma de teatro popular da Itália do século 15, que tinha em cena os mesmos personagens —sendo os mais conhecidos o arlequim, o pierrô e a colombina. Depois, se destacam a natureza irônica e surreal da obra, além do trabalho sinfônico do compositor.

Cantada em francês, “O Amor das Três Laranjas” estreou, em 1921, na Ópera de Chicago, mas sua origem remonta ao século 17, no compêndio de fábulas de Giambattista Basile. Seu libreto conta a história de um príncipe, interpretado pelo tenor Giovanni Tristacci, que, depressivo e hipocondríaco, só poderia se curar pelo riso.

O rei de Paus, encarnado pelo baixo Marco Antônio Assunção, se lamenta pela doença do filho e, com a ajuda de Trufaldino, vivido pelo tenor Jean William, tenta elaborar brincadeiras para fazer o príncipe gargalhar.

Mas ele só ri quando Fada Morgana, papel da soprano Gabriella Pace, sofre um tombo. Contrariada, a bruxa, que desejava tomar seu lugar no trono, o enfeitiça, e o príncipe passa a ficar obcecado por três laranjas. De uma delas, sai Ninete, personagem da soprano italiana Maria Sole Gallevi. O príncipe se apaixona pela jovem, mas, para se vingar, Morgana a transforma num rato.

Com direção cênica de Luiz Carlos Vasconcelos, criador do circo Piolin, a montagem do Municipal tem quatro pontos positivos. Regido por Mário Zaccaro, o Coro Lírico Municipal se revela expressivo, atendendo às exigências da obra de Prokofiev. No libreto, o coro tem proeminência, reagindo aos episódios capitais da trama, como no teatro da Grécia Antiga.

Já Tristacci cumpre a função do bom tenor. Ele assume para si a força dramática da obra, com seu timbre versátil, atuando bem em pianíssimos e notas altas. No dueto com Ninete, as cores de sua voz se desenham no ar, sempre com doçura. Nesse encontro, Gallevi, a soprano, vence a orquestra na primeira nota, mostrando potência e limpidez na voz.

Pace tem desempenho regular, mas é prejudicada pela caracterização excessiva dos personagens malévolos. William, por seu turno, atinge o perfil de Trufaldino, ainda que o papel exija ainda mais leveza do tenor.

Sob o aspecto musical, “O Amor das Três Laranjas” não é uma ópera de árias marcantes. Como bom russo, a composição de Prokofiev elege o ritmo como elemento estruturante, tanto que a passagem mais famosa da composição é uma marcha ribombante.

Regida por Roberto Minczuk, a Orquestra Sinfônica Municipal mostra que a cadência não se restringe à percussão, se estendendo aos metais, em diálogo com vozes graves, como a de Assunção, o baixo. A música aparece atada ao texto, repleto de interjeições, que marcam os compassos.

A direção cênica e a concepção visual da montagem, porém, são ruins. Vasconcelos não atinge a complexidade da trama fabular, satírica e meditativa. A opção por transformar a cena num picadeiro é impertinente. A montagem sublinha a galhofa sem explorar a ironia de uma obra que elogia o humor, mas se inicia com o coro pedindo a tragédia. O humor, portanto, está na ópera, não fora dela.

Por extensão, o contraste entre o príncipe melancólico e o libreto burlesco inexiste, sendo concebido em momentos justapostos. O cenário também não ajuda, porque só explora as cores e formas da commedia dell’arte.

Como o próprio nome sugere, a concepção da ópera deve se apegar à plasticidade dos elementos cênicos. A direção de arte e o desenho de luz preferem, ao contrário, reproduzir projeções patéticas, que mais parecem um computador ligando.

É frustrante procurar a vivacidade da cor laranja e não encontrar. As três laranjas aparecem, afinal, murchinhas, murchinhas —todas chupadas.

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O AMOR DAS TRÊS LARANJAS

Quando: Até 8 de outubro

Onde: Theatro Municipal de São Paulo – pça. Ramos de Azevedo, s/nº

Preço: R$ 10 a R$ 120

Classificação: Livre

Avaliação: Bom

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