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USP Leste consolida identidade, mas lida com baixa procura e evasão

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Inaugurado há 15 anos, o campus da USP na zona leste de São Paulo ainda tem árvores baixas, que denotam sua relativa juventude, mas já possui uma identidade definida: a interdisciplinaridade. Por outro lado, enfrenta desafios que incluem a evasão e a baixa procura por alguns cursos, além da necessidade de consolidação dos programas de pós-graduação.
A unidade, no bairro de Ermelino Matarazzo, perto da divisa com Guarulhos, foi inaugurada em 2005 pelo então governador Geraldo Alckmin (PSDB) com a missão de “ir aonde o povo está” e de oferecer cursos ligados a oportunidades de trabalho.
Por essa razão, as graduações, como as de gerontologia, obstetrícia e têxtil e moda, têm perfil diferente das oferecidas no campus Butantã.
Todas elas preveem um ciclo básico que une diversas áreas do conhecimento antes das disciplinas específicas.
Os cursos ficam todos sob o guarda-chuva da EACH (Escola de Artes, Ciências e Humanidades), que tem outra inovação: é a única grande unidade da USP sem departamentos. A característica favorece interação maior entre disciplinas.
Professor do curso de gestão de políticas públicas, Pablo Ortellado cita o exemplo do seu grupo de pesquisa. “Em geral, uma pós-graduação sobre estudos culturais tem um monte de sociólogo. Nós temos biólogo, físico, matemático, gente das artes, da literatura, linguista. Isso não aconteceria no Butantã”, diz ele, que fez graduação e doutorado em filosofia na Cidade Universitária.
Aluna de ciências da natureza da USP Leste, Renata Oliveira dos Santos, 23, confirma a impressão. Ela entrou no curso já pensando em migrar para biologia. No ciclo básico, porém, apaixonou-se pela área de educação.
Junto a Bruno Trivelatto, 26, do curso de sistemas de informação, e de Flávio Pereira, também aluno, montou uma empresa júnior que desenvolve um jogo de robótica para crianças. O grupo adaptou para o projeto um jogo desenvolvido por colegas da área de saúde para idosos com alzheimer.
Se exemplos como esse mostram que a proposta acadêmica foi implantada com sucesso, por outro lado pontos do projeto inicial ainda parecem não estar plenamente consolidados. É o caso da proposta de cursos alinhados a maior demanda social.
Segundo os dados da Fuvest 2019, a concorrência média das graduações da USP naquele ano, contando todas as unidades, foi de 13,8 candidatos por vaga. Na EACH, nenhum curso chegou a esse patamar. Os que chegaram mais perto foram marketing, com 8,39 inscritos por vaga, obstetrícia (8,45), têxtil e moda (10,62) e biotecnologia (11,26). Já os demais tiveram menos de cinco pretendentes por vaga.
Os dados da Fuvest se referem a 75% das vagas oferecidas pela USP. As demais foram disponibilizadas no Sisu (Sistema de Seleção Unificada).
A diretora Mônica Sanches Yassuda diz acreditar que o quadro se deva ao fato de algumas das carreiras estarem em processo de consolidação.
Segundo ela, está em discussão o remanejamento de parte das 1.020 vagas oferecidas pela EACH por ano. Uma possibilidade é a criação de um bacharelado em artes.
Outro desafio que a diretora aponta é o de reduzir a evasão. Atualmente, cerca de 30% dos alunos deixam curso da USP Leste ao longo da graduação.
A média não destoa daquela da USP em geral. Estudo feito pela Pró-Reitoria de Graduação com base no período de 2000 a 2018 mostrou que 22,4% abandonaram a universidade e 13,4% migraram para outra unidade da própria USP.
No caso da EACH, o cálculo de 30% de evasão inclui tanto estudantes que deixaram a USP como os que mudaram de curso na própria universidade, explica o professor Tiago Mauricio Francoy, que estuda o tema. Algumas graduações da unidade, no entanto, destoam dessa média, alcançando índices próximos a 40%, como ciências da natureza e gerontologia.
Para combater o problema, a escola implantou um sistema de tutoria, com foco principalmente no primeiro ano, e estuda outras medidas.
Outro desafio atual do campus Leste é a pós-graduação.
Atualmente, a EACH tem 11 programas, mas a maior nota atingida na avaliação da Capes foi 4 -a escala vai de 1 a 7. Na USP como um todo, 63% dos programas têm notas 5, 6 e 7.
Para a diretora, o resultado faz parte de processo natural de amadurecimento da pós-graduação, e as próximas avaliações já devem mostrar uma nova realidade.
Como legados positivos da USP Leste, Mônica destaca, além da interdisciplinaridade, a inclusão.
Um estudo de 2018 comparou o perfil dos ingressantes pela Fuvest na EACH com o do restante da USP. Mostrou que, no campus da zona leste, 50% tinham renda de até cinco salários mínimos, enquanto na universidade essa proporção ficava em 37%.
Casos como o de Kaio Gabriel Gameleira da Silva, 20, mostram o potencial e os desafios da inclusão.
Ele nem sequer sabia o que era a USP, ou que existiam universidades gratuitas, quando estudava em uma escola estadual vizinha ao campus Leste.
Veio a descobrir em 2016, quando uma mestranda que trabalhava na escola divulgou um programa de pré-iniciação científica.
Kaio fez dois anos de cursinho popular e passou direto em lazer e turismo. Depois, se transferiu para gestão de políticas públicas. “Percebi que a comunidade precisa muito mais disso do que de equipamentos de lazer.”
De seu bairro, o Jardim Keralux, Kaio só conhece mais duas alunas na EACH. Hoje, ele ajuda a gerir o cursinho popular para que esse número cresça. “Chego aqui em três minutos a pé. É realmente incrível estudar ao lado de casa”, diz.

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