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Crise econômica só passa se crise sanitária for resolvida, diz chefe da Stellantis na América Latina

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em 2019, Antonio Filosa, então presidente da FCA América Latina, disse à sua equipe que a marca Fiat assumiria a liderança do mercado nacional em 2021.

A meta ambiciosa era baseada nos produtos que seriam lançados ao longo dos anos, resultados do investimento de R$ 16 bilhões que se iniciou em 2018 e terminará em 2025.

Apesar de todos os problemas atuais, a profecia está se cumprindo. Impulsionada pelas vendas da picape compacta Strada, a Fiat terminou abril com 22,2% de participação nas vendas, um recorde para a marca.

Os bons resultados levaram Filosa à presidência do grupo Stellantis na América do Sul. Consolidada neste ano, a fusão de gigantes do setor automotivo reuniu as marcas Fiat, Jeep, Peugeot e Citroën, entre outras.

Desde que assumiu seu novo posto, em janeiro, um problema tem dominado o cotidiano de Filosa: a falta de componentes para alimentar as linhas de produção da empresa na região. “Há risco [de interrupção da produção] maiores ou iguais do que o dos meses anteriores”, afirmou.

Em entrevista à reportagem, o executivo falou sobre desafios da indústria, vacinação no Brasil e perspectivas para 2022.

“A crise econômica se revolve desde que seja resolvida a crise sanitária, e a solução para essa é a vacinação”, disse.

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Pergunta – Antes de ocorrer a fusão entre os grupos FCA e PSA Peugeot Citroën, Fiat e Jeep já passavam por um ciclo de investimentos na América do Sul. Os valores foram revistos para contemplar as demais marcas do grupo Stellantis?

Antonio Filosa – O plano começou ligado à FCA e a seus fornecedores, com início em 2018 e término em 2025. Previa uma série de produtos novos, incluindo a nova Strada e os futuros SUVs da Fiat e da Jeep, que serão lançados neste ano, e também o compacto 500e, elétrico. Até agora está tudo mantido conforme o planejamento, mas estamos discutindo novas variáveis.

Há um importante lançamento previsto para os próximos 12 meses em Porto Real [cidade fluminense onde são fabricados modelos Peugeot e Citroën]. Estamos indo bem, rediscutindo os próximos cinco anos e as sinergias.

A falta de insumos afeta toda a indústria, mas, neste momento, a marca Fiat tem sofrido menos no Brasil, com paradas pontuais na produção e liderança de mercado. O desenvolvimento nacional de produtos como a Fiat Strada tem influência nesse resultado?

AF – É um problema global, que afeta todas as regiões e empresas. Nós também tivemos perdas, mas conseguimos manejar com uma interrupção parcial, com monitoramento. Ter produtos localizados ajuda, mas também há um grau de sofrimento por trazer os semicondutores de fora. Acredito ver uma melhoria importante no fim do ano e uma solução definitiva no início de 2022.

E no curto prazo, alguma esperança?

AF – Este quadrimestre será severo. A melhora será pouco perceptível agora, e deverá ser mais notada nos quatro últimos meses do ano.

Então há riscos de interrupções maiores do que as que foram feitas até então pelo grupo Stellantis, um cenário ainda mais difícil.

AF – Sim, há risco maiores ou iguais do que o dos meses anteriores. Vamos trabalhar para reduzir esse risco, planejando semana após semana.

Em visita recente ao Brasil, Carlos Tavares [presidente global do grupo Stellantis] disse que uma das preocupações da indústria era a geografia de produção dos chips e dos semicondutores, hoje concentrada na Ásia. A empresa tem algum plano para assumir a fabricação desses componentes?

AF – Temos algumas coisas para colocar na mesa e definir as estratégias futuras. Há muito a aprender nessa crise, tanto por nós como pelos fornecedores. A gente precisa criar estratégias, mas ainda não sei se passará pela localização da produção. Estamos muito empenhados em resolver as emergências do dia a dia.

Temos que resolver os problemas do hoje, que ocupam a maior parte do nosso tempo, e depois fazer uma lista de ideias para melhorar e reduzir essa dependência, que é resultado de uma produção muito concentrada.

Todos os problemas com peças e mais a desvalorização do real afetam o preço dos carros. O que a Stellantis está fazendo para adaptar o mercado à explosão de valores?

AF – O carro no Brasil nunca foi tão barato em dólares e nem tão caro em reais. Todas as matérias primas são dolarizadas, e se esquecermos todos os problemas tributários e a ineficiência logística do país, ainda assim, em dólar, nosso carro é menos caro que os automóveis das demais regiões.

Mas existe a inflação dos materiais, uma precificação que é impossível evitar. Entendo o peso disso em reais, estamos trabalhando em processos para mitigar ao máximo isso.

Como vai funcionar a sinergia no grupo Stellantis? Teremos produtos de diferentes marcas compartilhando as linhas de produção?

AF – A força de reunir marcas diferentes em uma grande empresa nos dá a possibilidade de trabalhar com compartilhamento de plataformas e de projetos, usar as plantas que temos para produzir carros de diferentes marcas. São sinergias também para a utilização de horas de engenharia e de design.

Tudo está se materializando em um plano feito região por região, e cada uma tem um objetivo a seguir. Sabemos aonde queremos chegar, e acho que estamos indo bem.

A Stellantis surgiu em um momento muito turbulento no Brasil. Como a empresa enxerga o país para 2022?

AF – O problema é muito complexo e fruto de duas crises: a sanitária, que é a mais importante, e a econômica, que vem como consequência. Essa impacta os mercados, o consumo e a produção.

A solução das duas crises está na vacinação. Quanto mais rápido for, mais rápido será o retorno [das atividades], com a melhor previsibilidade da demanda.

A crise econômica se revolve desde que seja resolvida a crise sanitária, e a solução para essa é a vacinação. Infelizmente, a oferta de vacinas ainda é limitada –precisamos correr atrás de trazer o maior número possível de doses. Cerca de 30 milhões foram aplicadas, mas precisamos de dez vezes mais que isso. Quanto mais efetiva for essa corrida, mais rapidamente encontraremos condições de superar a crise econômica.

Como o senhor enxerga o mercado automotivo para o ano que vem?

AF – Acredito que o mercado vai fechar um pouco abaixo de 2,4 milhões de unidades vendidas neste ano. Em 2022, com a vacinação em massa e o fim da crise sanitária, acredito que estaremos perto de 2,7 ou 2,8 milhões. Será um ano bom, onde todos terão somente o foco de acelerar a recuperação econômica.

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RAIO-X

ANTONIO FILOSA, 47

Presidente do grupo Stellantis na América do Sul, é formado pelo Instituto Politécnico de Milão e entrou no grupo Fiat em 1999, onde passou por áreas como manufatura, compras e marketing em diferentes países

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