Agro

Geadas em áreas de café no Brasil geram temor de ‘default’; recuperação pode levar anos

Por Nayara Figueiredo e Marcelo Teixeira e Maytaal Angel

SÃO PAULO/NOVA YORK (Reuters) – As geadas que afetaram áreas cafeeiras do Brasil nesta semana geraram o temor de que produtores decidam pelo “default” nas entregas do café recém-colhido, que foi vendido a tradings de commodities há meses por preços que equivalem à metade dos valores atuais.

Uma onda de frio incomum, com temperaturas caindo para níveis congelantes em questões de minutos na manhã do dia 20 de julho, atingiu o coração do cinturão de café do Brasil, danificando lavouras e afetando as perspectivas para as safras do próximo ano.

Agora, é possível que produtores pensem duas vezes antes de cumprir suas obrigações contratuais na atual safra, disseram operadores e analistas, na esteira de uma disparada dos contratos futuros do arábica negociados na ICE.

“Esses agricultores venderam café por apenas 500 reais (por saca)”, disse Judy Ganes, analista de soft commodities nos Estados Unidos, acrescentando que a produção de café do Brasil já foi reduzida pela pior seca em 90 anos.

Antes das geadas, alguns produtores tentaram renegociar preços com tradings.

“O mercado já falava de ‘defaults’ quando os preços estavam 40 centavos de dólar mais baixos”, disse um operador de café no mercado europeu, que acrescentou que a alta recente “tornou o risco dez vezes mais provável.”

Os preços do café arábica subiram 10% nesta quinta-feira, para 1,95 dólar por libra-peso, maior patamar em seis anos e meio.

Um corretor que trabalha com grandes tradings internacionais que obtêm café em Minas Gerais, maior Estado produtor da commodity no Brasil, disse que o mercado físico está paralisado, mas acrescentou que “até agora, não recebemos qualquer notificação formal de produtores dizendo que não vão entregar.”

Airton Gonçalves, que possui quase 400 mil pés de café em Patrocínio (MG), disse que entregou 1.500 sacas à trading europeia Sucafina nesta semana, um dia antes da geada de 20 de julho. Ele havia concordado, há alguns meses, em vender este café por uma média de 640 reais por saca.

Corretores disseram ter tomado conhecimento de ofertas de 1.050 reais/saca em Minas Gerais nesta quinta-feira –que não tiveram vendedores.

TAMANHO DAS PERDAS, RECUPERAÇÃO LENTA

Estimativas sobre possíveis perdas para a safra do ano que vem variavam nesta quinta-feira, com o mercado digerindo os danos. Projeções iniciais de perdas de 1 milhão a 2 milhões de sacas rapidamente aumentaram.

A exportadora de café Guaxupé disse que espera um corte de 4,5 milhões de sacas em estimativas iniciais de quase 70 milhões de sacas para a safra 2022.

Ganes, que viajou ao Brasil três vezes neste ano para avaliar a seca e as geadas, disse que ainda é cedo demais para especular.

“Há muitas imagens aéreas circulando. Mas ninguém sabe se essas árvores terão de ser podadas, o que resultará em produção zero no ano que vem, ou se precisarão ser retiradas, o que significaria produção zero por dois ou três anos”, disse ela.

Eduardo Carvalhaes, veterano corretor de café em Santos (SP), afirmou que viveiros de café também foram atingidos pelas geadas, o que vai dificultar o replantio por parte dos produtores.

Airton Gonçalves, que acredita que terá de remover cerca de 80 mil árvores queimadas, não tem certeza se conseguirá encontrar mudas.

“Pode ser que eu tenha de plantar milho nessa área no ano que vem, enquanto espero os pés chegarem ao mercado.”

(Reportagem de Nayara Figueiredo em São Paulo, Marcelo Teixeira em Nova York e Maytaal Angel em Londres; reportagem adicional de Julia Symms Cobb em Bogotá)

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