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‘Ela venceu’, diz tia de jovem morta pela PRF, orgulhosa de a sobrinha ter começado curso de enfermagem

A morte da avó Maria da Paz foi um marco na vida de Anne Caroline. Aos 19 anos, era ela quem cuidava das feridas, fazia curativos e conferia o açúcar da idosa diabética. No sepultamento, a menina dedicou a música “Lei da Vida”, de Sabrina Lopes, à matriarca. E prometeu se tornar médica: “quero ajudar as pessoas”, disse aos presentes. A escolha da canção se justificava pela letra. “Hoje morreu um sonho / Que ele descanse em paz / Na estrada da vida / Somos passageiros”.

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Carol, como era conhecida, deu o primeiro passo em direção ao sonho em 2021, quando começou o curso técnico de Enfermagem. Com amigos e familiares, compartilhava vídeos e fotos dos aprendizados em sala de aula; era a primeira a ter oportunidade de estudar na área da Saúde. Faltavam pouco mais de oito meses para ela se formar quando um tiro interrompeu seu sonho e o compromisso assumido em família.

Anne Caroline Nascimento Silva morreu aos 23 anos, no “auge da vida”, como disseram alguns de seus familiares durante o velório na última segunda-feira, em Cordovil, na Zona Norte do Rio. Por volta das 22h de sábado, ela voltava de um restaurante em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, com o marido Alexandre Roberto Mello, de 32 anos, quando o carro onde estavam, um Jeep Renegade esverdeado, foi alvejado por agentes da Polícia Rodoviária Federal na Washington Luiz (BR-040). Os dois estavam comemorando sete anos juntos.

As circunstâncias da morte ainda têm lacunas a serem respondidas pela Polícia Federal, responsável pela investigação do homicídio. De acordo com a PRF, policiais haviam sido avisados por motoristas sobre um carro em alta velocidade que fazia manobras bruscas na rodovia. O veículo teria passado pelos agentes, que mandaram que parasse. Contudo, conta Alexandre, eles teriam dispararam dez vezes contra o carro antes que pudesse obedecê-los. Um dos integrantes da equipe foi preso em flagrante e liberado no domingo, após audiência de custódia.

A gente olhava para Carol e pensava: “ela venceu”

A beleza de Carol ao nascer fez a mãe Lúcia imaginar estar diante de uma princesa, conta Janete, tia e confidente da jovem. A gratidão e o receio de machucar a criança, a mais velha de três irmãos, fizeram Lúcia ficar atônita. O zelo foi tamanho que ela não teve coragem de dar banho em bacia na bebê nos primeiros dias. Assustada com a possibilidade de machucá-la, optou por higienizá-la com panos umedecidos.

Aos 16 anos, Anne conheceu Xande, como chamava o namorado, e em pouco mais de quatro meses decidiram morar juntos. O rapaz conta que a decisão não foi bem aceita pela família de Carol, principalmente pela diferença de idade e pelo fato de ele ter dois filhos pequenos frutos de outro relacionamento. Com o tempo, no entanto, se acostumou.

A mãe de Carol a ajudava a pagar o curso técnico com o salário de diarista, o mesmo que a fez criar os três filhos sozinha. A oportunidade da jovem na enfermagem era vista pela família como a chance de sua emancipação, de mudar de vida.

— A Carol sempre dizia: “eu vou vencer”, “tenho fé em Deus”. A gente olhava as fotos dela de jaleco e pensava: “é, ela venceu mesmo”. O sonho dela era ser médica, como havia prometido para a avó, mas não é fácil para um jovem de comunidade conseguir isso. Carol queria concluir o técnico, conseguir um trabalho na área e, com o salário, pagar a faculdade de medicina — relata Janete.

A tia descreve Anne como amorosa, cuidadosa e responsável, mas chama atenção para a maturidade da jovem, considerada a “conselheira da família”.

— Ela era uma menina de falas sábias, sempre cheia de conselhos. Era cercada de primos e sempre os aconselhava, dizia para serem responsáveis, juntarem dinheiro, pensarem no futuro. Tinha muita fé, ia à igreja todo domingo — completa.

Além de cursar medicina, Carol sonhava dar uma casa melhor para a mãe, que sofria com depressão desde a morte de Maria da Paz, em 2019. Ela também desejava se casar em 2024 e ter um filho. Se pudesse escolher, gostaria de ter uma menina.

— Carol era a única capaz de tirar a Lúcia de casa, de fazê-la se arrumar um pouco. Com a morte da minha sobrinha, não sei o que fazer da minha irmã. A morte acabou com a minha família. Eu não durmo há dois dias, olho as fotos dela e começo a chorar. Lúcia está à base de calmantes. Só podemos guardar em Deus. Saber que a alma da Carol está com o Senhor é o único alívio.

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