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O caminho do empoderamento feminino cresce pelo empreendimento

A advogada e música Bárbara Mendes, de 50 anos, enfrentou um duplo abalo há cerca de dez anos: ao mesmo tempo que se separou do marido americano, passou de sócia para única dona do restaurante Bangalô, na Barra da Tijuca.

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— Entrei de sócia meio que para dar uma assessoria, porque sou formada em Direito, e ele não falava português — recorda.

A ideia de abrir o negócio havia sido de seu ex-marido. Bárbara ficava responsável principalmente pelas atrações musicais. Depois que se separaram, e ele voltou para os Estados Unidos, ela precisou aprender a administrar o local. As filas na porta e o polvo apreciado na região provam o sucesso do esforço.

A experiência de Bárbara reflete o aumento da participação feminina no empreendedorismo. As mulheres representam um em cada três donos de negócios no Brasil, à frente de 9,9 milhões de empresas, segundo o Sebrae. Têm maior participação nos setores de comércio (26%); outros segmentos (21%); alojamento e alimentação; (12%), indústria (12%); e informação, comunicação, financeiro (11%).

Especialistas explicam que a constituição familiar brasileira, que envolve muitas mães solo, e a comodidade do home office estão entre os atrativos que levam as mulheres, por interesse ou necessidade, a empreender.

Bárbara, que passou a cuidar sozinha da filha de 7 anos com a separação, fez questão de aprender todas as funções do negócio. Desde descascar camarão até a montar a planilha de receitas e despesas. Para a advogada, conciliar as duas funções só foi possível graças a uma rede de apoio da família, que morava perto de sua casa.

— Fiquei três anos trabalhando umas 18 horas por dia. A minha grande força motriz naquele momento foi o “tem que fazer”. Eu não tinha escolha, aquilo tinha que dar certo. Então de certa forma isso serviu como um empurrão e me ajudou a não me sentir culpada ou magoada por estar fazendo aquilo — lembra.

Hoje, a empresária diz que já consegue balancear melhor a sua vida pessoal e o trabalho. Continua seguindo a carreira de música e já conseguiu até mesmo voltar a fazer shows nos Estados Unidos.

A atuação “multitarefas” atribuída às mulheres é vista como um dos traços que as levam a colocar de pé um negócio enquanto conciliam atividades do cotidiano, como cuidar dos filhos e realizar atividades domésticas. Em outra frente, a busca por capacitação é maior entre as mulheres, como explica a gerente de Conhecimento e Competitividade do Sebrae Rio, Margareth Carvalho.

— Dentro do Sebrae, as mulheres são as que mais procuram se qualificar. Mesmo com várias demandas durante o dia, muitas conseguem se multiplicar mais facilmente e, por isso, ficam mais atentas aos seus negócios — explica. — Se a gente levar em consideração o crescimento da economia do cuidado e do empreendedorismo social, vemos que são ramos que nós, mulheres, acabamos mais acostumadas a lidar.

Respeito conquistado

Para a surpresa de Bárbara, as burocracias e complexidades de gerir um restaurante, além do papel de mãe solo, não foram sua principal dificuldade.

— Meu maior desafio era fazer com que a equipe me respeitasse. Eu percebi que como mulher trabalhando em um bar, na noite, em um meio que é visto como masculino, e eu sendo cantora, as pessoas não me respeitavam — relata a empresária, que disse ter sido necessário “trabalhar dez vezes mais que todos eles” para que percebessem que ela daria conta do recado.

Apesar dos problemas iniciais com a equipe, a empresária afirma que boa parte dos funcionários que estavam no restaurante quando ela assumiu a gestão permanece até hoje. Bárbara também conta que ao começar a administrar o negócio percebeu que o ex-marido e sócio havia deixado alguns problemas.

— Quando eu estava casada, eu não tinha noção de que ele não tinha a menor noção de administração. Ele era bom em montar cardápio, treinar, fazer logística, mas restaurante não é só isso. Percebi que meu ex-marido, por ser estrangeiro, não tinha entendimento de certas coisas, não tinha noção das leis trabalhistas. Ele não trabalhava com planilha — afirma.

Quando assumiu a gestão, Bárbara começou a organizar as contas e processos da empresa, o que contribuiu para a insatisfação de parte dos funcionários:

— É muito mais fácil viver sem regra, sem ninguém te cobrar nada. Mas as regras clareiam muita coisa, e depois que implementamos as mudanças a gente conseguiu lucrar mais. Eu acredito muito em que, se você faz as coisas corretamente, os resultados vêm. Tive que ser firme com os funcionários. Sabia que a mão de obra era boa e também precisava da expertise deles. Mas ninguém vai te respeitar na porrada, vai te respeitar pelo seu conhecimento.

Hoje, Bárbara consegue rir do machismo que ainda encontra pelo caminho. A empresária conta que são frequentes as situações em que algum cliente pergunta quem é seu sócio e duvida quando ela diz que administra o restaurante sozinha. Quando está com seu atual marido, a empresária também ouve questionamentos de se ele seria o responsável pelo negócio.

— Quando comecei, ouvia apostas sobre quanto tempo eu iria durar lá dentro. Tem gente que chega até hoje no Bangalô e pergunta se não tem dono, se é só dona. Meus funcionários hoje riem e vêm me contar. Dizem: “Olha lá, chegou mais um desses” — brinca.

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