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40 anos da restauração de ‘As meninas’: uma limpeza marcada pela polêmica que devolveu a luz ao quadro

Enquanto John Brealy trabalhava sobre aquele que é considerado o ícone da pintura espanhola, uma das obras mais importantes de Velázquez, “As meninas” (1656), em 1984, começaram a ouvir-se gritos do outro lado de uma das portas do Museu do Prado, em Madri. Era um professor de Belas Artes com um grupo de estudantes que exigiam ver o quadro, para que o restauro fosse interrompido. Eles alegaram ter testemunhado Brealy levantando camadas de tinta. O perito se assustou, pensou que vinham linchá-lo, parou o trabalho do dia e saiu pela outra porta. Lá se vão 40 anos.

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Outra polêmica foi sobre a nacionalidade de Brealy. Diversas pessoas queixaram-se porque, segundo elas, deveria ter sido um espanhol a tocar num dos ícones da pintura do país.

— Fui condenado antecipadamente. Antes que soubessem o que eu iria fazer, já havia sido julgado negativamente. Houve um setor de profissionais que fecharam a sua posição inicial e, mais tarde, mesmo que estivessem satisfeitos com o meu trabalho, não quiseram ceder — disse o profissional.

Brealy fez uma limpeza geral, ou seja, não dividiu a pintura por janelas ou áreas, como fazem alguns restauradores. Ele começou pelo lado direito, com o ponto de luz principal. Este método marcou a forma como muitas pinturas do Museu do Prado foram limpas desde então.

Ele não tocou em mais nada. A pintura, que sobreviveu ao incêndio do Alcázar de Madri em 1734, e foi transferida para Valência durante a Guerra Civil e de lá para Genebra, quase não apresenta danos, apenas alguns arranhões. Há um corte na saia de Isabel de Velasco, outro na bochecha direita da Infanta Margarita. No verso da tela, no teto, onde ficam os painéis, há alguns danos. É realmente um milagre como foi preservado.

Antes de concluir a restauração, Brealy ligou para Manuela Mena, então vice-diretora do Prado. Queria que estivesse presente no toque final. É preciso focar o olhar no último degrau da porta na parte inferior da pintura: é o local mais afastado do observador com uma luz muito particular que o restaurador recuperou com a sua limpeza.

Após finalizar a limpeza da pintura, Brealy deu-lhe uma última demão de verniz de resina natural com maior estabilidade para evitar o amarelecimento. Antes de se despedir, fez uma surpresa para a jovem equipe de restauradores do Prado: permitiu que Rocío Dávila, outro jovem restaurador, lhe desse a última camada, que é conhecida como reintegração.

Graças ao restauro, o espectador pode ver novamente a pintura, apreciar a profundidade e os planos que Velázquez idealizou com a gestão da luz que entra, sobretudo, pela janela.

Plácido Arango (que algum tempo depois foi mecenas do Museu do Prado) financiou a estadia de John Brealy em Madri. Ou seja, pagou as despesas, mas não o salário, porque Brealy não cobrou um euro pelo seu trabalho. A restauração custou 5.400 dólares, na época.

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