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Um ano após processos de recuperação judicial, Saraiva e Cultura seguem registrando prejuízo

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – As livrarias Saraiva e Cultura continuam acumulando prejuízos, a despeito das duras medidas que adotaram para tentar sobreviver à crise que atinge o mercado editorial brasileiro nos últimos anos.
As duas empresas, que estão em processo de recuperação judicial, já fecharam 54 lojas –38% do total– desde 2017 e demitiram 2.451 funcionários –47,8%. Mesmo assim, continuam a operar no vermelho.
Prestes a perder o posto de maior rede de livrarias físicas do país para a Livraria Leitura, de Minas Gerais, a centenária Saraiva teve um prejuízo líquido de R$ 155,4 milhões de janeiro a novembro de 2019.
A empresa, que chegou a ter 112 lojas em 2017, hoje trabalha com 73 e responde a 30 ações de despejo na Justiça. No final de 2018, sem conseguir pagar dívidas de R$ 675 milhões, recorreu à recuperação judicial para ter fôlego e tentar evitar a decretação da falência.
Recuperação judicial é um mecanismo pelo qual a Justiça suspende as ações de execução por 180 dias, prazo no qual a empresa deve apresentar um plano de pagamento aos credores, que precisa ser aprovado por eles em assembleia.
No caso da Saraiva, os fornecedores exigiram e obtiveram o afastamento do CEO, Jorge Saraiva Neto, bisneto do fundador, que começou o negócio como um sebo no centro de São Paulo.
O novo conselho de administração escolheu para ocupar o cargo o executivo Luis Mario Bilenky, que já foi presidente da Blockbuster e diretor de marketing do McDonald’s para a América Latina.
“O cenário é de atenção, mas com perspectiva de melhora”, afirma o advogado Ronaldo Vasconcelos, administrador nomeado pela Justiça para acompanhar o processo de recuperação da Saraiva. “Com a profissionalização da gestão, deverá voltar a dar lucro ao longo deste ano.”
Ainda que deficitário, o último balanço da rede mostra que o prejuízo de novembro de 2019, de R$ 13,25 milhões, foi 54,5% menor na comparação com o mesmo mês do ano anterior, de R$ 29,14 milhões.
No início de janeiro, Vasconcelos apresentou um parecer apoiando o plano da Saraiva de vender galpões e um terreno que tem em Guarulhos, avaliados em R$ 24,5 milhões.
“Sem capital de giro, a empresa não terá como honrar seus compromissos e manter o abastecimento regular de suas lojas e do site”, disse.
Da mesma forma que a Saraiva, a Cultura enfrenta dificuldades e está em recuperação desde 2018 por não conseguir pagar dívidas de R$ 285,4 milhões. No ano passado, apesar das medidas de ajuste, acumulou até novembro um prejuízo líquido de R$ 37,7 milhões.
Para manter suas atividades, a rede pretende vender, em leilão no dia 30 de janeiro, a Estante Virtual, plataforma online de venda de livros usados, que tem cerca de 4 milhões de clientes.
O site foi comprado pelo grupo em 2017, no auge do processo de expansão da empresa criada 70 anos antes na sala de estar de sua fundadora, Eva Herz. À época, ela se chamava Biblioteca Circulante e era um modesto empreendimento de aluguel de livros.
Com o sucesso, o negócio virou uma livraria em 1950. Dezenove anos depois, quando passou a ser gerido por Pedro Herz, filho de Eva, migrou para o Conjunto Nacional, na avenida Paulista, sua principal loja.
Em 2017, além do Estante Virtual, a Cultura incorporou também a subsidiária brasileira da francesa Fnac. Na ocasião, a notícia do negócio surpreendeu o mercado devido à situação financeira já delicada da livraria em meio à crise econômica do país.
Em documento enviado à Justiça, a administradora Alvarez & Marsal, nomeada para acompanhar o processo de recuperação da empresa, apontou a estagnação da economia brasileira, a partir de 2014, como uma das principais razões para o sufoco da livraria. “A redução do PIB em quase 10% impactou negativamente o consumo de livros”, afirma o texto.
Outro fator, segundo o documento, seria a nova geração de consumidores, “que não tem o hábito de ler livros, preferindo assistir a séries de TV e interagir nas redes sociais”.
Segundo estudos da Câmara Brasileira do Livro, com base em informações prestadas pelas editoras, houve uma queda de 26,7% na quantidade de exemplares vendidos no país entre 2013 e 2018.
Foram 479,9 milhões de obras comercializadas no primeiro ano desse período, considerando o mercado normal e o de compras governamentais, contra 352 milhões no ano em que as duas livrarias entraram em recuperação, em 2018. Ou seja, 127,9 milhões a menos.
Outra pesquisa, o Painel do Varejo de Livros no Brasil, produzida pela Nielsen e pelo Sindicato Nacional dos Editores de Livros com dados de varejistas, entre eles livrarias, supermercados e a Amazon, mostra que o mercado encolheu mais uma vez no ano passado.
Mesmo que tenha registrado crescimento em dezembro, quando o faturamento do setor atingiu R$ 188 milhões –valor 6,61% superior em relação ao mesmo mês de 2018 -, o acumulado do ano foi de cerca de R$ 1,7 bilhão –R$ 115 milhões a menos. O volume de vendas também foi menor em 2019, com decréscimo de 6,35% se comparado a 2018.
Procuradas, as duas redes de livrarias não quiseram se manifestar sobre os prejuízos acumulados até o momento.
À Justiça, a Saraiva afirma que o “objetivo é superar gradativamente as dificuldades” e que a crise é momentânea.
Em documento anexado ao processo, a Cultura diz que seu futuro é promissor. “As décadas futuras provavelmente reservarão ao grupo crescimento tão ou mais expressivo do que aquele já experimentado ao longo de sua história.”

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