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Light entra na Justiça para suspender pagamento de dívidas financeiras

Por Leticia Fucuchima

SÃO PAULO (Reuters) – A Light ajuizou medida cautelar com pedido de liminar para suspender temporariamente a exigência de pagamento de dívidas e para buscar uma mediação coletiva com credores, disse a companhia de energia elétrica em fato relevante nesta terça-feira.

O documento protocolado na véspera em segredo de justiça e caráter de urgência, visto pela Reuters, envolve apenas credores financeiros, como os bancos Citibank, Morgan Stanley, Santander, Bradesco e Itaú, além de XP, o fundo FIDC Light e DTVMs.

O total das dívidas financeiras englobadas pela cautelar não é informado, sendo que no documento os advogados da empresa afirmam apenas se tratar de um “expressivo valor que, em breve, será exigido em sua totalidade das Requerentes (empresas do grupo Light)”.

A medida vem após a Light ter iniciado, no mês passado, conversas com credores para renegociar dívidas, em um esforço para melhorar sua estrutura de capital e preservar o caixa.

A medida não envolve suspensão de pagamentos pela Light de obrigações intrassetoriais, como aquelas relacionadas a contratos da distribuidora com geradores, transmissores e encargos setoriais, destacou a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

“Também estão preservadas integralmente as obrigações com fornecedores de serviços, equipamentos, mão de obra e funcionários”, acrescentou a Aneel em nota à imprensa.

EM BUSCA DE MEDIAÇÃO

No pedido de liminar, a empresa solicita a instauração de procedimento de mediação coletiva com as partes em torno das obrigações financeiras, ressaltando que não tem o objetivo de “suprimir” pagamentos, mas sim “viabilizar um caminho pelo qual o Grupo Light possa reajustar suas obrigações financeiras de modo a torná-las compatíveis com realidade”.

A companhia também disse que pretende, com a medida cautelar, “inibir a precipitação de medidas judiciais geradoras de ‘efeito cascata’ de cobrança”.

Ao final de 2022, a dívida líquida consolidada da Light era de 9 bilhões de reais, sendo que mais de 3 bilhões tem vencimento previsto para 2023 e 2024.

Entre os motivos para a piora recente de sua situação financeira, a elétrica citou o “agravamento do notório e peculiar contexto de segurança pública do Estado do Rio de Janeiro”, situação que a impede de atuar em alguns locais de sua área de concessão, levando a perdas de receita com furtos de energia, por exemplo.

“Desconsiderar as particularidades do Rio de Janeiro significa fechar os olhos para a realidade suportada pela população fluminense e superada pelo Grupo Light diariamente para a prestação do serviço de forma adequada”.

Além disso, a empresa apontou como agravante o fato de que, após o rebaixamento de seus ratings de crédito por agências de classificação de risco, alguns credores iniciaram “medidas extracontratuais para aceleração de dívidas”.

“O FI-FGTS, por sua vez, valeu-se de previsão contratual que o autorizava a vencer antecipadamente a integralidade da dívida na hipótese de significativo rebaixamento de rating”, exemplificou.

O pedido de cautelar para estancar cobranças e iniciar uma mediação com credores tem sido utilizado por empresas, mais recentemente, como uma “medida preparatória” para futuros pedidos de recuperação judicial, aponta Renato Scardoa, sócio de SDS Advogados, escritório especializado em pequenas e medias empresas em crise.

No entanto, os regimes de recuperação judicial e extrajudicial, em tese, não seriam aplicáveis no caso da Light, por se tratar de uma concessionária de serviços públicos de energia elétrica.

Scardoa criticou o fato de a ação correr em segredo de justiça, avaliando que a empresa se utilizou de uma interpretação “enviesada” da Lei de Mediação.

“O que a lei diz é que os procedimentos da mediação têm que ser sigilosos, e não o procedimento judicial onde ela vai ser conduzida. Na minha visão, o processo tem que correr aberto, para conhecimento do público geral, e as negociações devem ocorrer às portas fechadas”, afirma o advogado.

Ele afirma ainda que seu escritório, que está assessorando fornecedores de outras empresas em dificuldades, como Americanas e Petrópolis, já conversou e mapeou “entre 20 e 30” fornecedores da Light para assessorar em futuros desdobramentos do processo.

LIGHT NO FOCO

A Light é responsável pela distribuição de energia em mais de 30 municípios do Rio de Janeiro e enfrenta um grave desequilíbrio econômico-financeiro, em meio à dificuldade para combater furtos de energia e à devolução de valores bilionários em créditos tributários aos consumidores.

A situação se agravou neste ano, conforme se aproxima o vencimento de parte importante das dívidas da companhia, ao mesmo tempo em que o futuro da concessão de distribuição, que expira em meados de 2026, continua incerto.

O presidente-executivo da Light, Octavio Lopes, disse no fim de março que a companhia buscava uma “solução sustentável” para seu endividamento, que poderia envolver primeiro as necessidades de fluxo de caixa de curto prazo.

Depois das declarações sobre a renegociação de dívidas, agências de classificação de risco cortaram novamente os ratings de crédito da companhia elétrica. A Fitch considerou que o acesso da Light a financiamentos é “limitado e/ou muito oneroso”, devido às condições atuais do mercado e ao seu perfil de crédito.

Já a Moody’s disse na sexta-feira passada que o novo rating da Light, Caa3, implica alta probabilidade de inadimplência com uma taxa média de recuperação para os devedores entre 65% e 80%.

Mesmo com a piora financeira recente, a Light vem reforçando que está adimplente com obrigações setoriais e que a empresa está cumprindo com metas regulatórias.

Nesta terça-feira, a Aneel disse que, mesmo antes da publicação do resultado financeiro da Light do quarto trimestre de 2022, havia colocado a empresa em “regime diferenciado” de acompanhamento de seus indicadores econômico-financeiros.

No chamado “Plano de Resultados”, a Light pactua com a Aneel as ações necessárias para a sustentabilidade da concessão, disse a reguladora, acrescentando que “adotará as medidas necessárias, preventivas e/ou coercitivas” para assegurar a prestação adequada da distribuição de energia elétrica pela empresa.

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