Entenda como a reforma tributária afeta a vida dos brasileiros
Entenda como a reforma tributária afeta a vida dos brasileiros O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PL-AL), iniciou a semana com a promessa de pautar até sexta-feira (7) a votação em plenário da mais aguardada reforma do sistema econômico brasileiro. O texto negociado entre o Ministério da Fazenda, sob comando de Fernando Haddad (PT), e o grupo de Lira na Câmara tem como principal objetivo a simplificação do sistema de impostos pela via da criação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA). Para explicar o novo modelo e esclarecer quem é contra e quem é a favor, Natuza Nery conversa com Manoel Ventura, repórter do jornal O Globo, em Brasília. Neste episódio:
Manoel conta por que o andamento da reforma na Câmara “ganhou tração” nos últimos meses: a busca por protagonismo de Lira e o empenho dos ministros da Fazenda e do Planejamento pela pauta. “É uma reforma muito importante para reduzir a complexidade do sistema tributário brasileiro, e possibilitar atração de investimentos”, afirma;
O jornalista descreve de que modo o IVA deve ser aplicado: será dividido em dois, um federal e outro estadual. “A peculiaridade é que a alíquota deve ser a mesma [para todos os estados; hoje, cada um aplica a sua de modo independente]”, afirma – a mudança desagrada a governadores;
Ele exemplifica com os casos do bombom, perfume e sorvete as distorções do sistema tributário brasileiro – resultado de lobby setorial e de estratégias do governo para incentivo de determinados produtos. No texto da reforma, sabe-se que “serviços de educação e saúde terão alíquotas 50% menores que a alíquota geral”;
Manoel esclarece a introdução do ‘cashback’ para os consumidores de baixa renda e dependentes de programas sociais, como o Bolsa Família: “Assim, focaliza-se a política pública”.
Reforma tributária: veja os principais pontos da proposta do relator
O relator da reforma tributária, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), divulgou na semana passada seu parecer sobre as mudanças no sistema tributário brasileiro que tramitam na Câmara dos Deputados. A expectativa é que o tema seja analisado em julho.
O texto ainda poderá sofrer alterações, mas, entre os pontos principais, estão a substituição de impostos federais e estaduais por uma cobrança única, alíquota menor para saúde, educação e cesta básica, “cashback” para as classes menos favorecidas e IPVA para jatinhos, iates e lanchas.
O principal objetivo da reforma tributária é simplificar a cobrança dos impostos no país, medida considerada fundamental para destravar a economia e impulsionar o crescimento e a geração de empregos. Por outro lado, setores como os serviços e comércio temem uma carga tributária mais alta em suas atividades.
Veja a seguir os principais pontos do que está sendo discutido no Congresso:
Criação do IVA
O que é: IVA é a sigla para o modelo de imposto sobre o valor agregado (ou adicionado). Na proposta de reforma tributária, cinco impostos que existem hoje seriam substituídos por dois IVAs — por isso, esse modelo é chamado de IVA dual. Ficaria assim:
No lugar de três tributos federais (PIS, Cofins e IPI), entra a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência federal;
No lugar do ICMS (estadual) e do ISS (municipal), entra o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), com gestão compartilhada entre estados e municípios.
Veja abaixo como seria o pagamento do IVA* em um processo de fabricação e comercialização de uma camisa
*No exemplo, foi considerada uma alíquota fictícia de 10%. O texto apresentado pelo relator Aguinaldo Ribeiro não indicou quais serão as alíquotas adotadas para o IVA.
Qual será a alíquota do IVA?
Ainda não há definição. O secretário extraordinário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, já estimou que a alíquota do futuro IVA, necessária para manter a carga tributária, seria de 25%.
O texto preliminar da reforma tributária prevê a criação de uma alíquota padrão, uma alíquota reduzida e isenção para alguns produtos e serviços. Não há indicação, porém, do valor dessas alíquotas.
Se for confirmada uma alíquota de 25% para o futuro IVA, será uma das maiores do mundo.
Imposto seletivo
A proposta também prevê a criação de um imposto seletivo sobre bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente (como cigarros e bebidas alcoólicas). O imposto vai incidir sobre a produção, comercialização ou importação desses produtos.
‘Cashback’
O “cashback” é a devolução de impostos para um público determinado, como a população de baixa renda. Apesar do substitutivo propor esse mecanismo, o tema só será regulamentado depois, por meio de lei complementar.
Alíquotas reduzidas
A proposta do relator Aguinaldo Ribeiro propõe ainda uma tributação menor para alguns bens e serviços:
serviços de transporte público coletivo urbano, semiurbano ou metropolitano;
medicamentos;
dispositivos médicos e serviços de saúde;
serviços de educação;
produtos agropecuários, pesqueiros, florestais e extrativistas vegetais in natura;
insumos agropecuários, alimentos destinados ao consumo humano e produtos de higiene pessoal (segundo Ribeiro, aqui estão incluídos os produtos da cesta básica);
atividades artísticas e culturais nacionais.
A ideia é que esses produtos e serviços paguem metade do valor da alíquota geral — que ainda será definida.
Embora traga uma alíquota menor para saúde e educação, a proposta não contempla todos os setores de serviços.
Estudo da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) divulgado nesta semana diz que, caso a alíquota IVA seja de 25%, haverá aumento da carga tributária no setor de serviços, o que ameaçaria 3,8 milhões de empregos.
Isenções
O texto também propõe que:
alguns medicamentos específicos, como os utilizados para o tratamento contra o câncer, ficarão isentos da cobrança do futuro IVA;
redução de 100% da alíquota do IVA federal (chamado de CBS) incidente sobre serviços de educação de ensino superior (Prouni);
possibilidade de produtores rurais que atuam como pessoas físicas e tenham receita anual de até R$ 2 milhões ficarem “livres” de recolher o futuro IVA dual (CBS e IBS). De acordo com Aguinaldo Ribeiro, essa medida contemplaria mais de 98% dos produtores rurais do país.
Tratamentos diferenciados
Alguns tipos de produtos e serviços poderão receber tratamento específico por terem peculiaridades e não se adequarem ao regime geral de incidência do IVA.
O texto prevê os seguintes casos:
Combustíveis e lubrificantes: alíquotas uniformes cobradas em uma única fase da cadeia e possibilidade de concessão de créditos para os contribuintes;
Serviços financeiros, operações com bens imóveis, planos de assistência à saúde e concursos de prognósticos (como as loterias): alterações nas alíquotas, nas regras de creditamento e na base de cálculo, além da possibilidade de tributação com base na receita ou no faturamento;
Compras governamentais: não incidência do IVA dual (IBS e CBS), desde que haja manutenção dos créditos relativos às operações anteriores da cadeia.
Zona Franca de Manaus e Simples Nacional
O texto prevê a manutenção da Zona Franca de Manaus e do Simples Nacional.
A Zona Franca concede benefícios fiscais para as indústrias instaladas na região, com o objetivo de fomentar empregos e gerar renda na Amazônia. O regime foi criado em 1967 e tem validade assegurada até 2073.
O Simples é um regime tributário simplificado para micro e pequenas empresas
Como será a transição para o novo modelo?
Pela proposta, serão dois tipos de transição:
Transição federativa: entre 2029 e 2078
Esse será o período necessário para aderir ao princípio do destino. Ou seja, ao final do período dessa transição, toda a cobrança será feita no município e no estado onde ocorre o consumo do bem ou do serviço (e não onde o produto é produzido, como acontece hoje).
Transição para o modelo de IVA dual: entre 2026 e 2032
Nesse intervalo, os cinco tributos existentes hoje (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) serão gradativamente substituídos pelo novo modelo de IVA.
A substituição começa pelos impostos federais. Em 2027, haverá extinção de PIS e Cofins e redução a zero das alíquotas do IPI (exceto na Zona Franca de Manaus, cuja manutenção é proposta no texto de Aguinaldo Ribeiro).
Em 2029, tem início o prazo de transição do ICMS. A transição termina em 2032 e, no ano seguinte, o antigo sistema de tributação (PIS/Cofins, IPI, ICMS e ISS) estará extinto.
Fundos de compensação
A proposta prevê dois fundos que serão custeados com recursos do governo federal:
Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais
Fundo para compensar benefícios fiscais já concedidos hoje e que estão garantidos até 2032.
Duração: de 2025 a 2032.
Valor total do fundo: R$ 160 bilhões. No primeiro ano, em 2025, o aporte será de R$ 8 bilhões, aumentando gradativamente até atingir R$ 32 bilhões em 2028 e 2029. Depois, reduz progressivamente até chegar a R$ 8 bilhões em 2032, último ano de pagamento.
Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR)
Fundo com objetivo de reduzir as desigualdades regionais. Com os recursos, os estados poderão realizar obras de infraestrutura; estimular atividades produtivas com elevado potencial de geração de emprego e renda; e promover o desenvolvimento científico e tecnológico da região.
Duração: começa em 2029, sem prazo estipulado para o fim.
Valor total do fundo: No primeiro ano, serão R$ 8 bilhões, aumentando progressivamente até 2032. A partir de 2033, o governo federal vai destinar ao FDR R$ 40 bilhões por ano.
O valor do Fundo de Desenvolvimento Regional é um dos pontos sem acordo até o momento. Governadores pediram R$ 75 bilhões por ano para esse fundo, valor acima dos R$ 40 bilhões propostos.
Outra questão em aberto é como os recursos do FDR serão distribuídos entre os estados.
Conselho federativo
A proposta cria o Conselho Federativo do Imposto sobre Bens e Serviços com gestão compartilhada por estados, Distrito Federal e municípios. O objetivo do conselho é gerir o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que vai substituir o ICMS (estadual) e o ISS (municipal).
Tributação da renda e do patrimônio
🚤 O relator Aguinaldo Ribeiro também incluiu no relatório mudanças na cobrança de impostos sobre renda e patrimônio:
IPVA para jatinhos, iates e lanchas: pelo sistema atual, esses veículos não pagam o tributo. O texto também prevê a possibilidade de o imposto ser progressivo em razão do impacto ambiental do veículo;
Tributação progressiva sobre heranças: a cobrança do ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação) seria progressiva em razão do valor da herança ou da doação. A proposta também cria regra que permite cobrança sobre heranças no exterior.
O texto prevê ainda que, em até 180 dias após a promulgação da proposta, o governo deve enviar ao Congresso Nacional a reforma da tributação da renda. Fonte: G1