Central America

Retórica incendiária de Trump agrava protestos contra racismo nos EUA

O discurso incendiário do presidente Donald Trump, que defendeu uma repressão dura contra os protestos nos EUA, agravou ainda mais a situação. As manifestações contra o racismo e a violência policial, que chegaram ao oitavo dia, tiveram ontem mais gente na rua do que o habitual em Nova York, Los Angeles e Washington.

Em Nova York, uma multidão desceu a Primeira Avenida e se concentrou na Foley Square nas primeiras horas da tarde. Protestos também ocorreram em outros pontos da cidade, como Brooklyn e Queens. As aglomerações preocupam as autoridades sanitárias, que temem uma nova onda de contaminações na cidade mais afetada pela covid-19 no país.

Atlanta, Los Angeles e Houston também registraram uma concentração grande de pessoas, assim como a capital, que viveu uma madrugada caótica depois da violência registrada na segunda-feira, quando a polícia usou bombas de gás e balas de borracha para retirar os manifestantes da frente da Casa Branca – o objetivo era abrir caminho para Trump posar para fotos diante da Igreja de St. John segurando uma Bíblia na mão.

Os manifestantes acabaram se dispersando pelos bairros de Washington e foram caçados durante a madrugada. A segurança foi reforçada. Veículos blindados da Guarda Nacional cercaram a Casa Branca e cruzamentos estratégicos. Helicópteros deram rasantes durante a noite, jogando luz sobre quem estivesse na rua.

De acordo com o New York Times, citando fontes do Departamento de Justiça, a ordem para reprimir os protestos pacíficos diante da Casa Branca foi dada pessoalmente pelo secretário de Justiça, William Barr. A decisão foi criticada por democratas – e também por alguns republicanos.

“Donald Trump transformou o país em um campo de batalha, alimentada por velhos ressentimentos e novos medos”, afirmou Joe Biden, adversário do presidente nas eleições de novembro. “É isso o que queremos ser? É isso que queremos passar para nossos filhos e netos?” Muitos viram no discurso de Biden, feito na Filadélfia, o relançamento de sua campanha, até então discreta em razão da pandemia de coronavírus.

Alguns aliados também se queixaram, embora o tom das críticas tenha sido mais ameno. “A questão é, foi certo usar gás lacrimogêneo para abrir caminho para que o presidente tirasse uma foto? Claro que não”, afirmou o senador Tim Scott, único negro republicano no Senador.

A diocese episcopal de Washington, que é comandada por uma mulher, Mariann Budde, também reclamou do presidente. “Foi um ultraje”, afirmou Mariann. “O presidente usou a Bíblia e uma das igrejas da minha diocese, sem nos perguntar, como cenário para uma mensagem antiética dos ensinamentos de Jesus e de tudo o que nossa igreja prega.”

Em queda. Alguns analistas, porém, preferiram explicar o gesto de Trump – que não é religioso e não frequenta a igreja. Pesquisas do Public Religion Research Institute, realizadas em abril, mostram que o presidente perdeu apoio entre os evangélicos brancos (11 pontos porcentuais), católicos brancos (12 pontos porcentuais) e protestantes brancos (18 pontos porcentuais).

Ontem, foi a vez de Trump fazer um afago aos católicos. Ao lado da primeira-dama, Melania, ele esteve no santuário nacional dedicado a João Paulo II, em Washington. Os dois posaram para fotos diante da estátua do papa, mas não escaparam de uma nova saraivada de críticas.

As mais duras vieram do arcebispo de Washington, Wilton Gregory. “Acho desconcertante e repreensível que qualquer instalação católica se permita ser tão flagrantemente manipulada de uma maneira que viola nossos princípios religiosos”, disse o arcebispo. “Ele (João Paulo II) certamente não toleraria o uso de gás lacrimogêneo para silenciar, espalhar ou intimidar os manifestantes para tirar fotografias em frente a um lugar de oração e paz.”

Diante dos ataques, a Casa Branca convocou seus aliados mais fiéis, que ontem defenderam as últimas ações do presidente. “A imprensa caiu na tática dos agitadores profissionais”, disse o senador republicano Marco Rubio. “Todos sabiam que a multidão tinha de ser dispersada em razão do toque de recolher. E esperaram a polícia entrar em ação para ter a história que queriam e dizer que os policiais atacaram manifestantes pacíficos.”

Kellyanne Conway, assessora da Casa Branca, respondeu à bispa da igreja de St. John. “A igreja não é dela. A Bíblia não é dela. Não examinamos o coração e a alma das pessoas ou julgamos a fé ou por que o presidente quis caminhar até lá”, disse Kellyanne. “Precisamos de mais orações, não menos.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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