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Petrobras não construirá plataformas inteiras no Brasil, diz diretor; FUP rebate

Por Sabrina Valle

HOUSTON (Reuters) – A Petrobras vai ajudar a revitalizar a indústria de construção naval do Brasil, com contratos para descomissionar plataformas antigas ou fabricar módulos para novas embarcações, mas não para construir plataformas inteiras, disse à Reuters o diretor-executivo de Engenharia, Tecnologia e Inovação, Carlos Travassos.

Empregos criados pela indústria naval ancorados por contratos da Petrobras são um pilar fundamental para o programa político do presidente Luiz Inácio Lula da Silva desde sua primeira eleição em 2002.

Naquele ano, ele disse que as plataformas poderiam ser construídas no Brasil, e ordenou a volta de duas que estavam no oceano Atlântico a caminho da Ásia para obras, argumentando que a Petrobras não poderia exportar esses empregos. Lula recentemente concluiu a alteração completa da alta cúpula da Petrobras.

No entanto, a companhia vê limitações para trazer para o Brasil trabalhos como a construção do casco, que normalmente é feito na Ásia, para as duas dúzias de plataformas do tipo FPSO que planeja até 2027, disse o diretor.

“Nenhum país faz o FPSO inteiro”, disse Travassos em Houston, usando a sigla para as plataformas flutuantes capazes de armazenar e transferir petróleo. “A indústria (naval) brasileira precisa apostar em suas vocações.”

Os cascos dessas embarcações são altamente customizados e qualquer país levaria anos na curva de aprendizagem antes de estabelecer uma linha de produção estável, disse ele. O processo inicial provavelmente resultaria em custos mais altos e entregas atrasadas.

Também adiaria os planos da empresa de aumentar sua produção em projetos liderados por ela em quase um quarto, para 4,7 milhões de barris por dia de petróleo e gás em 2027. Cada FPSO pode custar até 3 bilhões de dólares para ser construído.

A estratégia de construção naval da Petrobras põe à prova a disposição de Lula de usar a estatal para gerar empregos no país, estratégia que aplicou em seus dois primeiros mandatos, mas não sem polêmica.

Os sindicatos de metalúrgicos e da indústria naval, que apoiaram a eleição de Lula, enviaram cartas abertas no mês passado pressionando publicamente o governo para rever o processo de contratação da Petrobras, de forma a aumentar encomendas no Brasil.

Eles criticaram o sistema de contratações concentrado em apenas três estaleiros: EBR, Keppel Fels e Jurong, os dois últimos do mesmo grupo asiático.

“Vemos uma oportunidade muito boa para o mercado (naval) brasileiro, mas não é em casco de FPSO. Vemos em módulo, onde tem muita tecnologia abarcada,” disse Travassos.

Construir módulos é menos complexo, disse Travassos. Requer canteiros de obras menores, pode ser replicado mais facilmente e a experiência da força de trabalho pode ser transferida para a construção de plantas de refino, biodiesel ou hidrogênio.

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“Uma vez que o Brasil se qualifique para construir módulos, terá uma oportunidade muito maior de perpetuar o negócio, em vez de aprender a fazer cascos de FPSO e competir com a Coreia, a China”, disse.

Os sindicatos da siderurgia e o lobby da construção naval pediram que a Petrobras elevasse voluntariamente o conteúdo local de pelo menos cinco plataformas, para os campos de Albacora, SEAP e Sépia e Atapu.

“O que eu tenho de conteúdo local colocado hoje não consegue ser atendido pelo mercado. Então não faz sentido elevá-lo”, disse Travassos.

SINDICATO CONTESTA

Em nota publicada após a publicação da reportagem, a Federação Única dos Petroleiros (FUP) rebateu as falas do diretor e voltou a defender a retomada da política de conteúdo local.

Na nota, o coordenador-geral da federação, Deyvid Bacelar, disse não ser verdade que a indústria nacional não conseguiria atender índices de conteúdo local em plataformas nos campos de Albacora, SEAP e Sépia e Atapu.

“O que exclui as empresas brasileiras é o modelo de contratação da Petrobras, com contratos únicos, com fluxo de caixa negativo”, afirmou Bacelar.

“A indústria nacional está tentando trabalhar na construção de módulos no Brasil. Mas só os estaleiros ligados à Keppel, na Ásia, têm recebido encomendas da matriz, e esta empresa não se dispõe a contratar concorrentes. Se a Petrobras contratasse os módulos separadamente, eles poderiam ser construídos em estaleiros no país.”

Bacelar defendeu ainda que conteúdo nacional é questão de política de governo. “Não cabe a um diretor da Petrobras se pronunciar oficialmente sobre o assunto, sobre o qual deve receber ordens e cumpri-las”, afirmou.

Para o representante da FUP, a nova gestão da Petrobras deveria suspender os editais de contratação de plataformas no exterior e destinar a construção para o Brasil. Segundo ele, a estrutura básica para a retomada de elevado conteúdo nacional não foi destruída e está mantida a competência técnica da engenharia, da universidade, das empresas brasileiras e dos trabalhadores.

(Reportagem de Sabrina Valle; reportagem adicional de Marta Nogueira)